segunda-feira, fevereiro 15, 2010

Os espiritismo de Kardec

José Edmar Arantes

No início da 1a. edição de Le Livre des Esprits (O Livro dos Espíritos), datada de 1857, na seção "Introduction à l'étude de la doctrine spirite" (Introdução ao estudo da doutrina espírita), Allan Kardec escreve o seguinte (negrito meu):

"(...) le spiritualisme est le opposé du matérialisme; quiconque croit avoir en soi autre chose que la matière est spiritualiste; mais il ne s'ensuit pas qu'il croie à l'existence des esprits ou à leurs communications avec le monde visible. Au lieu des mots spirituelspiritualismenous employons, pour désigner cette dernière croyance, ceux de spirite et de spiritisme, dont la forme rappelle l'origine et le sens radical, et qui par cela même ont l'avantage d'être parfaitement intelligibles. Nous dirons donc que la doctrine spirite ou le spiritisme consiste dans la croyance aux relations du monde matériel avec les esprits ou êtres du monde invisible".

Em uma tradução livre:

"(...) o espiritualismo é o oposto do materialismo; quem quer que creia haver em si outra coisa além da matéria é espiritualista; mas daí não resulta que creia na existência de espíritos ou em suas comunicações com o mundo visível. Em lugar das palavras espiritualespiritualismonós empregamos, para designar esta última crença, os vocábulos espírita e espiritismo, cuja forma recorda a origem e o sentido radical, e por isso têm a vantagem de serem perfeitamente inteligíveis. Nós diremos portanto que a doutrina espírita ou espiritismo consiste na crença em relações do mundo material com os espíritos ou seres do mundo invisível".

Ou seja, espiritismo seria simplesmente a crença na existência de espíritos e em suas comunicações com o mundo visível.

Pois bem. Em 1858 Kardec publica seu livro Instructions Pratiques sur les Manifestations Espirites (Instruções Práticas sobre as Manifestações Espíritas), que serviu de base para Le Livre des Mediums (O Livro dos Médiuns), publicado originalmente em 1861. No Brasil, o Instructions foi traduzido por Cairbar Schutel (Casa Editora O Clarim) e por Julio Abreu Filho (Ed. Pensamento). Em seu "Vocabulário Espírita" consta:

"Espiritismo: doutrina fundada sobre a crença na existência dos Espíritos e em sua comunicação com os homens".

Ou seja, o que antes foi definido apenas como uma crença passou a ser considerado uma doutrina fundada sobre a tal crença...

Em 1859 foi publicado, de Kardec, Quest-ce que le Spiritisme (O que é o Espiritismo) [1]. Neste livro, o codificador diz o seguinte à pág. 2 do "Préambule" :

"Pour répondre, dès à présent, à la question formulée dans notre titre , nous dirons que : le Spiritisme est la doctrine fondée sur l'existence des Esprits , ou êtres incorporels du monde invisible, et leurs rapports avec le monde corporel. On peut encore dire que : le Spiritisme est la science de tout ce qui se rattache à la connaissance des Esprits ou du monde invisible."

Em tradução livre:

"Para responder, agora, à questão colocada no nosso título, diremos que: o espiritismo é a doutrina baseada na existência de espíritos, ou seres incorpóreos do mundo invisível, e suas relações com o mundo corporal. Pode-se também dizer que: o espiritismo é a ciência de tudo o que se relaciona com o conhecimento dos espíritos ou do mundo invisível."

Ou seja, em linhas gerais, Kardec reiterou o que dissera em sua obra anterior.

Em 1860 foi a vez do surgimento da 2a. edição de Le Livre des Esprits, a "edição definitiva", utilizada como base para as principais traduções do livro no Brasil. Na versão de Guillon Ribeiro (Federação Espírita Brasileira -- FEB), consta o seguinte na parte I da "Introdução ao estudo da doutrina espírita" (negritos meus):

"(...) o espiritualismo é o oposto do materialismo. Quem quer que acredite haver em si alguma coisa mais do que matéria, é espiritualista. Não se segue daí, porém, que creia na existência dos Espíritos ou em suas comunicações com o mundo visível. Em vez das palavras espiritualespiritualismoempregamos, para indicar a crença a que vimos de referir-nos, os termos espírita e espiritismo, cuja forma lembra a origem e o sentido radical e que, por isso mesmo, apresentam a vantagem de ser perfeitamente inteligíveis, deixando ao vocábulo espiritualismo a acepção que lhe é própria."

Ou seja, neste trecho Kardec manteve o conceito que externara na 1a. edição de Le Livre des Esprits a respeito da palavra.

Porém, logo a seguir, tentando implementar ali a definição utilizada no Instruções Práticas sobre as Manifestações Espíritas (1858), ele acaba por se contradizer (negrito meu):

"(...) Diremos, pois, que a doutrina espírita ou o Espiritismo [nota: no original francês aparece spiritisme, ou seja, em itálico e sem a inicial maiúscula] tem por princípio [nota: no original francês consta pour principes] as relações do mundo material com os Espíritos ou seres do mundo invisível."

Ou seja, "espiritismo" deixou de ser a crença nas comunicações dos Espíritos com o mundo visível para ser algo que tem as nossas relações com os Espíritos apenas como pressuposto inicial...

É um vai e vem que não acaba mais!

Aqui, neste blog, tomaremos por base a definição de "espiritismo" dada por Kardec na 1a. edição de Le Livre des Esprits (1857), que se apresenta livre de quaisquer inconsistências, além de ser extremamente simples e abrangente:

ESPIRITISMO - Crença na existência de Espíritos e de relações destes com o mundo material.

______________

[1] Na página de dados editoriais da 49a. edição desta obra pela FEB (março de 2004), e muito provavelmente também na de todas as edições do livro publicadas a partir do início da década de 70 (quando tal página foi instituída nas publicações FEB), somos informados de que a edição em foco trata-se de uma tradução da versão original francesa da obra, de 1859. Pura mentira! A tradução ali apresentada é da edição definitiva da obra, a sexta, de 1865, "refundida e consideravelmente aumentada", onde Kardec mete os pés pelas mãos e acaba criando uma teia de contradições inaceitável em sua tentativa de definir "Espiritismo". Leiamos parte do "Preâmbulo" da obra em sua citada edição pela FEB (49a., março de 2004):

"Para responder, desde já e sumariamente, à pergunta formulada no título deste opúsculo, diremos que: O ESPIRITISMO É, AO MESMO TEMPO, UMA CIÊNCIA DE OBSERVAÇÃO E UMA DOUTRINA FILOSÓFICA. COMO CIÊNCIA PRÁTICA ELE CONSISTE NAS RELAÇÕES QUE SE ESTABELECEM ENTRE NÓS E OS ESPÍRITOS; COMO FILOSOFIA, COMPREENDE TODAS AS CONSEQÜÊNCIAS MORAIS QUE DIMANAM DESSAS MESMAS RELAÇÕES. Podemos defini-lo assim: O Espiritismo é uma ciência que trata da natureza, origem e destino dos Espíritos, bem como de suas relações com o mundo corporal".

Dois pontos nos saltam aos olhos após a leitura deste trecho:

1- Ao resumir sua definição, dizendo que o Espiritismo seria "uma ciência que trata da natureza, origem e destino dos Espíritos, bem como de suas relações com o mundo corporal", Kardec contradiz o que havia acabado de dizer, ou seja, que o Espiritismo seria uma ciência de observação e uma doutrina filosófica, pois que "natureza, origem e destino" dos Espíritos é um assunto que não é subsidiado nem pelo estudo observacional das manifestações mediúnicas, nem pelas consequências morais concernentes ao Espiritismo entendido como doutrina filosófica. Foram apresentadas, assim, duas definições completamente distintas de "Espiritismo", o que é um problema;
2- Não bastasse isso, pode-se facilmente verificar que ambas as definições contrastam tanto com a fornecida por Kardec no início de Le Livre des Esprits, como com aquela do "Vocabulário Espírita" que aparece em Instruções Práticas sobre as Manifestações Espíritas (e também em O Livro dos Médiuns), que seria reproduzida quase literalmente na 1a. edição de Quest-ce que le Spiritisme.

Resumindo: na versão definitiva desta obra, Kardec foi infeliz em sua tentativa de definição de "Espiritismo". Curiosamente, tem gente que ainda briga (tentando se justificar justamente com o trecho contraditório que reproduzimos acima!) dizendo que "isto é Espiritismo", "aquilo não é Espiritismo", etc. Convenhamos!...
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# A versão acima é de 01/06/2013.

sábado, dezembro 02, 2006

Médiuns brasileiros de efeitos físicos cujas faculdades foram documentadas em livros, teses, revistas, atas, etc. (rascunho)

1. Carmilo* Mirabelli (1888-1951) [*Também Carmene, Carmine, Carlo, Carlos]
- 1914-1950
- S. Paulo, SP; Rio de Janeiro, RJ
- Academia de Estudos Psychicos (depois Centro de Estudos Psichicos) “Cesar Lombroso” (S. Paulo), Instituto Psíquico Brasileiro de S. Paulo, Instituto Psíquico Brasileiro de Niterói, Academia Brasileira de Metapsychica (Rio de Janeiro)
- Tese "Contribuição ao Estudo da Psiquiatria (Espiritismo e Metapsiquismo)", apresentada na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro por Brasílio Marcondes Machado mas recusada (16/12/1922); livro “Prodigios da Biopsychica obtidos com o medium Mirabelli”, de Eurico de Goes (Tipografia Cupolo, 1937), e vários outros; tese "A defesa do Espiritismo na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro: a tese de Brasílio Marcondes Machado", apresentada na Universidade Federal de Santa Catarina por Artur César Isaia (2006)

2. Ana Prado
- 1918-1921
- Belém, PA
- Livrete "Fenômenos de Materialização", de Manuel Quintão (FEB, 1921), e livro “O Trabalho dos Mortos”, de Nogueira de Faria (FEB, 1921)

3. José Corrêa Neves
- 1937 (máximo) - 1954 (mínimo)
- Franca, SP; Instituto de Pesquisas Metapsíquicas (Grupo Espírita Pe. Zabeu), S. Paulo, SP
- Fotos no ICESP; Ata do "Grupo Espírita Pe. Zabeu", reproduzida em "Cumprindo-se Profecias", livro de Mario Ferreira, publicado pela Édipo em 1955

4. Peixotinho (Francisco Lins Peixoto)
- 1939-53
- Rio de Janeiro, RJ; Belo Horizonte, MG (1 vez); Pedro Leopoldo, MG; Fortaleza, CE
- Livros: "Materializações Luminosas" (LAKE, 1956; FEESP) e "Forças Libertadoras" (Ed. Eco, 1967), de R. A. Ranieri; "Na Madureza dos Tempos" (S/ed., 1987), de Gilberto Perez Cardoso e Newton Boechat; "Materialização do Amor" (Fraternidade Espírita Francisco Peixoto Lins, 1994), de Humberto Vasconcelos; "Dossiê Peixotinho" (Lachâtre, 1997), de Lamartine Palhano Jr. e Wallace Fernando Neves

5. Francisco Antunes Bello
- 1945-1946(ao menos)
- Centro Espírita Irmã Terezinha, Pindamonhangaba, SP
- Reportagens dos jornais "A Centelha" e "A Noite" no início de 1945; livro "Os Trabalhos Post-Mortem do Pe. Zabeu" (depois "Operações Espirituais"), de Urbano Pereira (1946); "Anuário Espírita de 1976"

**. Osvaldo ..., de S. Paulo, SP [**Item acrescentado em 28.02.2016]
- 1946 (ao menos)
- Centro Espírita Irmã Terezinha, Pindamonhangaba, SP
- Ata de sessão, reproduzida às pp. 327-28 de "Afinal, quem somos?" (Ed. Calvário, 7a. ed., 1972), livro de Pedro Granja

**. Elvira Goulart [**Item acrescentado em 28.02.2016]
- 1946 (ao menos)
- Casa localizada à R. da Moóca, 1705, S. Paulo, SP
- Sessão descrita às pp. 328-34 do livro supracitado

6. Benedito Cosme
- 1948-1988(ao menos)
- Centro Espírita Pe. Zabeu e Fraternidade Espírita Irmão Kamura, S. Paulo, SP
- Referências em "Movimento e Doutrina", e-book de Ivan René Franzolim disponível em http://www.espirito.org.br/portal/palestras/ivan-franzolim/movimento-e-doutrina.html

7. Chico Xavier (Francisco Cândido Xavier)
- fins da década de 40; 1952-53
- Pedro Leopoldo, MG
- Referências nos livros "Forças Libertadoras" (Ed. Eco, 1967) e "Chico Xavier - o santo dos nossos dias" (Ed. Eco, 1970), de R. A. Ranieri; "Chico Xavier - Mandato de Amor", da União Espírita Mineira (Ed. UEM, 1993); “As Vidas de Chico Xavier”, de Marcel Souto Maior (Ed. Rocco, 1994; Ed. Planeta); "Um Minuto com Chico Xavier", de José Antônio Vieira de Paula (s/ed, 1997; Ed. Didier, 1999)

8. Fábio Machado (1928-85)
- 1949-59
- Grupo Scheilla (de Jair Soares), Belo Horizonte, MG; Grupo Joseph Gleber, Fazenda Eureka, Itanhomi, MG
- Livros: “Materializações Luminosas” (LAKE, 1956; FEESP) e "Forças Libertadoras" (Ed. Eco, 1967), de R. A. Ranieri; e "Materializações Luminosas: Leis Cósmicas em Ação" (Ed. Espírita Fonte Viva, 2002), de Dante Labbate

9. Ênio Wendling (1926)
- 1953 (pelo menos)
- Grupo Irmã Scheilla, Belo Horizonte, MG
- Livro "Forças Libertadoras" (Ed. Eco, 1967), de R. A. Ranieri

10. Ivan Ferreira de Castro (1933-2004)
- 1955-2004
- Residência de Luiz da Rocha Lima (1955-1965) e "Santuário de Frei Luiz" (1965-2004), ambos no Rio de Janeiro, RJ
- Livros "Forças do Espírito" (Educandário Social Lar de Frei Luiz, 4a. ed., 1981), "Memórias de um Presidente de Trabalhos" (Educandário Social Lar de Frei Luiz, 1982), "Medicina dos Espíritos" (Educandário Social Lar de Frei Luiz, 2a. ed., 1992), todos de Luiz da Rocha Lima; livros "Médicos do Espaço" (Mauad, 2000) e "A Vida Além da Vida" (Mauad, 2005), ambos de Ronie Lima

11. Gilberto Arruda (1941)
- 1955-2004 (ao menos)
- Residência de Luiz da Rocha Lima (1955-1965) e "Santuário de Frei Luiz" (1965-2004), ambos no Rio de Janeiro, RJ
- Livros "Forças do Espírito" (Educandário Social Lar de Frei Luiz, 4a. ed., 1981), "Memórias de um Presidente de Trabalhos" (Educandário Social Lar de Frei Luiz, 1982), "Medicina dos Espíritos" (Educandário Social Lar de Frei Luiz, 2a. ed., 1992), todos de Luiz da Rocha Lima; livros "Médicos do Espaço" (Mauad, 2000) e "A Vida Além da Vida" (Mauad, 2005), ambos de Ronie Lima

12. Antônio Alves Feitosa
- 1958(máximo)-1961(mínimo)
- Centro Espírita Cabana do Pai Preto, St. André, SP
- "Atas do Centro Espírita Cabana do Pai Preto", algumas tendo sido reproduzidas na revista "Os Tempos Chegaram – coletânea de instruções colhidas no aprendizado espírita", números 1 e 2, de 1963 e 1964, respectivamente (nota: nestes registros, em algumas ocasiões Antônio A. Feitosa contou com Nizea dos Santos e Carmen Cunha Nicoletti como médiuns de apoio); n. de 18 de janeiro de 1964 da revista "O Cruzeiro"; livro "Otília Diogo e a Materialização de Uberaba", de Jorge Rizzini (Edicel, 1964), depois transformado em "Materializações de Uberaba" (LivroFácil-Nova Luz, 1997); artigos e entrevistas com Ary Brasil Marques, um dos redatores das "Atas do Centro Espírita Cabana do Pai Preto" quando dos fenômenos produzidos por Feitosa
- 1964(máximo)-1974(mínimo)
- Centro Espírita Casa da Paz, S. Paulo, SP
- Atas do Centro Espírita Casa da Paz

13. Maria José Lazera Duarte (1931-2005)
- 1959-61
- Recife, PE
- Depoimento de Valter da Rosa Borges (pesquisador da médium) a Vitor Moura Visoni, disponível em http://br.geocities.com/existem_espiritos/valter.html

14. Otília Diogo
- 1959-65
- Andradas, MG; Uberaba, MG; S. Paulo, SP
- Período 1963-64 documentado no n. de 3 de agosto de 1963 da revista "Fatos e Fotos"; em matéria de Jarbas Barbosa no "Anuário Espírita 1964"; nos ns. de 18 de janeiro e de 1o. de fevereiro de 1964 da revista "O Cruzeiro"; no livreto "Em Defesa da Mediunidade", de R. A. Ranieri (LAKE, 1964); no livro "Otília Diogo e a Materialização de Uberaba", de Jorge Rizzini (Edicel, 1964), depois transformado em "Materializações de Uberaba" (LivroFácil-Nova Luz, 1997); em matéria de Jarbas Barbosa no "Anuário Espírita 1965", e no livro "Forças Libertadoras", de R. A. Ranieri (Ed. Eco, 1967)

15. Walter Santos Rezende
- 1963 (ao menos)
- Uberaba, MG
- Matéria de Jarbas Barbosa no "Anuário Espírita 1964" e matéria de José Franco no n. de 18 de janeiro de 1964 da revista "O Cruzeiro"

16. Carmen Cunha Nicoletti
- Revista "Os Tempos Chegaram – coletânea de instruções colhidas no aprendizado espírita", números 1 e 2, de 1963 e 1964, respectivamente

17. José Costa Lima
- Revista "Os Tempos Chegaram – coletânea de instruções colhidas no aprendizado espírita", números 1 e 2, de 1963 e 1964, respectivamente

18. José Medrado
- 1988 (ao menos)
- Salvador, BA
- Livro "Outras Dimensões", de Carlos Bernardo Loureiro

(Este post foi revisado em 03.09.10 e teve seu título alterado em 01.11.12)