segunda-feira, junho 01, 2020

As sete linhas de umbanda, um reino de confusão

(Edmar Arantes)

Sob o nome "umbanda" os mais diversos sistemas de cultos religiosos foram e são albergados. Considerando sempre um setenário imaginativo (as ditas "linhas", com nomes e cores características), sem respaldo factual, a encontrar guarida apenas em mentes afeitas a encantos numerológicos (o 7 é sempre muito querido), já os primeiros autores que abordaram doutrinariamente o assunto foram incoerentes entre si. Era de se esperar. Sendo mero exercício de imaginação a qualificação de tais linhas, cada um tratou de exercê-lo a seu modo...

Aqui, neste texto, exporemos as classificações descritas por quatro autores que fizeram escola nas décadas de 30, 40, 50 e 60 do século passado: Leal de Souza, Lourenço Braga, Yokaanam e W. W. da Matta e Silva.

Leal de Souza

Tornou-se umbandista por suas visitas à Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade, localizada em Neves (bairro de São Gonçalo fronteiriço com Niterói/RJ) e então dirigida por Zélio de Moraes, considerado por alguns desavisados o "fundador da Umbanda" (vale perguntar: qual delas?). Simpatizou com a religião. Já então médium e dirigente espiritual (portanto, "entendido" do assunto), foi o primeiro autor a abordar em livro a doutrina umbandista, publicando a obra O Espiritismo, a Magia e as Sete Linhas de Umbanda em 1933, compilação de suas matérias no Diário de Notícias no ano anterior, nas quais dissertava sobre os assuntos mencionados no título do livro.

Logo no início da obra, o autor faz a seguinte afirmação disparatada: "O espiritismo de linha compreende, pelo menos, 99 subdivisões, ou linhas" (p. 12)... Carecia perguntar: É mesmo?! E tu constatou isso como? Rir pra não chorar.

No cap. XVIII, de Souza diz que a Linha Branca de Umbanda compreendia sete linhas (!), uma delas transversa (!!), que faria ligação com a Linha Negra... Lourenço Braga, autor que abordaremos em sequência, em sua obra Umbanda (magia branca) e Quimbanda (magia negra) fez a seguinte pertinente consideração quanto a isso:

Se chamarmos a Lei de Umbanda de Linha de Umbanda, que nome então daremos às sete linhas em que a Umbanda se divide, tais como sejam: Linha de Xangô, Linha de Ogum, Linha de Iemanjá, etc.? (pp. 24-25)

As sete divisões da "Linha Branca de Umbanda", segundo Leal de Souza, seriam as seguintes:
1- Linha de Oxalá, Nosso Senhor do Bonfim (Jesus Cristo). Cor característica: branco
2- Linha de Ogum, São Jorge. Cor característica: vermelho
3- Linha de Euxoce (Oxóssi), São Sebastião. Cor característica: verde
4- Linha de Xangô, São Jerônimo. Cor característica: roxo
5- Linha de Nha-San (Iansã), Santa Bárbara. Cor característica: amarelo
6- Linha de Amanjar (Iemanjá), N. Sra. da Conceição (Virgem Maria). Cor característica: azul
7- Linha de Santo ou das Almas, que não teria entidade católica como dirigente nem cor característica, sendo uma linha "transversa", que faria ligação com a Linha Negra

Já não bastasse o "apelidamento" de santos católicos com nomes de orixás africanos, o que de Souza "explica" dizendo que se trata dos nomes de tais santos na "língua de umbanda" (?!), no cap. XXI da obra ele vai além no disparate, referindo-se a orixás não como os chefes das linhas, mas como os vinte e um subordinados diretos de cada um deles... (nota de 09/06/2021)

Lourenço Braga

Publica em 1942, pela Livraria Jacintho, Umbanda (magia branca) e Quimbanda (magia negra). Sem citar nomes, faz uma explícita crítica à divisão de Leal de Souza:

(...) Não confundam a "Linha de Oxalá ou de Santo", de Umbanda, com a "Linha das Almas", que é da Quimbanda. A Linha das Almas é chefiada por Umulum, dono dos cemitérios! E Inhaçã não é linha, é uma "legião" pertencente à Linha de Xangô! (p. 35)

É curioso, no entanto, que, apesar de ter ressaltado no trecho acima transcrito que "Inhaçã" não é linha (Braga usa também a palavra "povo" como sinônimo), na p. 62 ele considera, sim, Inhaçã como linha, ressaltando ainda que a oferenda para este povo seria vinho fino, enquanto que para o de Xangô seria cerveja preta...

Segundo Braga, a "Lei de Umbanda" se dividiria nas seguintes linhas:
1- Linha de Santo ou de Oxalá, dirigida por Jesus Cristo
2- Linha de Iamanjá (Iemanjá), dirigida pela Virgem Maria
3- Linha do Oriente, dirigida por São João Batista
4- Linha de Oxoce (Oxóssi), dirigida por São Sebastião
5- Linha de Xangô, dirigida por São Jerônimo
6- Linha de Ogum, dirigida por São Jorge
7- Linha Africana, dirigida por São Cipriano

É de se notar que o autor não esclareceu a qual "São Cipriano" ele se referia (há quatro). Este ponto foi também observado por Matta e Silva em sua obra Umbanda de Todos Nós (ver pp. 101-102 da 3a. edição, de 1969).

Braga inova ao propor que cada uma destas 7 linhas seria também dividida em sete, totalizando assim 49 "legiões", o mesmo acontecendo para as 7 linhas da "Lei de Quimbanda". Nomeando as 7 linhas da "Lei de Umbanda", suas legiões, as 7 linhas da "Lei de Quimbanda" e ainda fornecendo nomes de vários "exus", o autor chega a cerca de 100 denominações! Haja imaginação...

Mais tarde, em 1956, publica, pela Editôra Souza, Umbanda e Quimbanda - volume 2, mudando o nome das linhas e de seus dirigentes. Dando outra direção ao seu viés imaginativo, redenomina a Linha de Santo ou de Oxalá para "Linha de Oxalá ou das Almas" (em sua versão anterior ele havia frisado que a Linha das Almas era da Quimbanda), muda os dirigentes das linhas de Iemanjá, do Oriente, de Oxóssi, de Xangô e de Ogum, que na "realidade" seriam dirigidas, respectivamente, pelos arcanjos Gabriel, Rafael, Zadiel, Orifiel e Samael, e substitui a Linha Africana pela "Linha dos Mistérios ou Encantamentos", que seria dirigida pelo arcanjo Anael. (Vide História da Umbanda, Alexandre Cumino, Ed. Madras, 2010, pp. 374-375.) Poderíamos dizer: esse não bate bem, não!

Yokaanam

Em 1952 publica Evangelho de Umbanda. Nesta obra as sete linhas são apresentadas da seguinte maneira:
1- Linha de S. João Batista (Xangô-Kaô, ou Xangô Maior). Cor característica: rosa
2- Linha de Sta. Catarina de Alexandria (Yanci). Cor característica: azul
3- Linha de Custódio (anjo), "diretor" de Cosme e Damião (Ibejês). Cor característica: branco
4- Linha de S. Sebastião (Oxoce). Cor característica: verde
5- Linha de S. Jorge (Ogum). Cor característica: vermelho escarlate
6- Linha de S. Jerônimo (Xangô). Cor característica: roxo-violeta
7- Linha de S. Lázaro (Ogum de Lei). Cor característica: amarelo

O primeiro ponto que nos salta à vista é a colocação de um anjo na mesma classe de santos católicos. Outro ponto é a utilização de "espécies" na mesma classe de "gêneros". Assim, Xangô-Kaô (um dos tipos de Xangô) estaria nivelado com o próprio Xangô, e Ogum de Lei (um dos tipos de Ogum) com o próprio Ogum. Absoluta falta de sistemática. Matta e Silva, autor que abordaremos em sequência, comentaria sobre isso em sua obra Umbanda de Todos Nós:

Esta é uma das concepções correntes mais chocantes, porque nota-se a completa falta de conhecimentos de base sobre Lei de Umbanda e fere nossa lógica, quando vemos seis Santos em paralelo com um anjo ou arcanjo, dirigindo as legiões, grupos ou linhas... Dizemos chocante ainda, porque assim como arranjaram o anjo Custódio que, pela hierarquia conhecida, em sua condição, deve estar acima dos Santos, substituíram também N. S. da Conceição (uma das concepções da Virgem Maria, que dizem ser Yemanjá), por Santa Catarina de Alexandria (Yanci), que asseveram atualmente estar no comando (desde quando? Como se passou este fato transcendental de que os outros mortais de fé não tiveram conhecimento até hoje?). E, para finalizar os "considerando" sobre esta concepção, verificamos mais que repartiram a direção da Linha de Ogum para dois Santos (S. Jorge e S. Lázaro): o primeiro é Ogum de Lei e o segundo, simplesmente Ogum... Nesta mágica, estão S. Jerônimo que é Xangô apenas ou Deus que habita os mistérios e S. João Batista, que é Xangô também, mas Kaô ou ainda Xangô Maior (p. 104 da 3a. edição, de 1969)

Concluindo com uma sensata consideração:

Cremos ser impossível penetrar no complexo da criatura que engendrou semelhantes legiões que, por certo, irá ainda mais confundir ou embaralhar esta Umbanda de todos nós, ainda tão incompreendida, perseguida e detratada! E quem, inteirando-se de mais este sincretismo, não terá um sorriso de ironia e de descrença? (p. 105)

Como bom codificador da religião, Yokaanam não poderia deixar de turbinar sua viagem imaginativa. Assim, para ele, "Umbanda" seria proveniente de "Um" (Deus) + "banda" (legião, exército). Legal demais, não?!

W. W. da Matta e Silva

Publica em 1956 Umbanda de Todos Nós, obra que fez grande sucesso, cuja 2a. edição, bastante aumentada, foi publicada em 1960 pela Livraria Freitas Bastos (sobre esta livraria-editora, vide aqui). O autor dissocia os termos "Oxalá", "Iemanjá", "Xangô", "Ogum" e "Oxóssi" (nomes de orixás africanos) de figuras do hagiológio católico1, dizendo que, na realidade, tais termos, juntamente com Yori e Yorimá, designariam as sete "Vibrações Originais" (p. 59 da 3a. edição, de 1969), emanadas pelos sete "Espíritos de Deus" (p. 56 da mesma edição), e reconceitua orixá como sendo qualquer dos espíritos dentre os chefes de legiões, de falanges e de subfalanges em cada linha (pp. 88 e 209)...

Propõe a seguinte classificação para as linhas da "Lei de Umbanda":
1- Linha de Oxalá, o Princípio, o Incriado, o Reflexo de Deus. Cores características: branco e amarelo-ouro
2- Linha de Yemanjá, a Divina Mãe, o Eterno Feminino, a Divindade da Fecundação. Cores características: amarelo e prateado
3- Linha de Xangô, o Ser Existente, o Dirigente das Almas, o Senhor da Balança. Cor característica: verde
4- Linha de Ogum, o Fogo da Salvação ou da Glória. Cor característica: alaranjado
5- Linha de Oxosi, a Ação Envolvente ou Circular dos Viventes da Terra. Cor característica: azul
6- Linha de Yori, a Potência em Ação da Luz Reinante. Cor característica: vermelho
7- Linha de Yorimá, a Potência da Palavra da Lei. Cor característica: violeta

Bem se vê que o autor não estava de brincadeira em seu exercício imaginativo... E não é só! Seguindo os devaneios numerológicos e nominais de Lourenço Braga, também afirma que cada uma destas 7 linhas seria dividida em sete, totalizando 49 legiões, o mesmo ocorrendo quanto às 7 linhas da Quimbanda. Nomeando tudo isso, Matta e Silva chega a mais de 100 denominações, só que com muitos nomes diferentes daqueles utilizados pelo autor de Umbanda (magia branca) e Quimbanda (magia negra)... Você, leitor, ficaria com qual conjunto de nomes? É questão de gosto, pois de realidade não há nem sinal.

No quesito imaginação, Matta e Silva superou a grande maioria dos autores umbandistas que o antecederam (perde talvez para Aluizio Fontenelle) e todos que o sucederam. Tudo feito de forma muito sistemática. Pois bem. Não bastasse o que já mostramos em uma postagem anterior deste mesmo blog2 e o que expusemos acima, há mais... Para o autor, "Umbanda" seria um termo "místico, litúrgico, sagrado, vibrado, cuja origem se encontra naquele alfabeto primitivo que os próprios Bhramas desconheciam a essência" (p. 31 da 3a. edição de Umbanda de Todos Nós), o mesmo se aplicando aos nomes das linhas (p. 60); "Umbanda" significaria conjunto das leis de Deus, uma vez que proviria de "Um" (Deus) + "ban" (conjunto) + "da" (lei) (p. 38); e por aí vai... Mas paremos por aqui.

_________________________
1- Antes dele, Oliveira Magno já havia feito o mesmo (vide Umbanda esotérica e iniciática, 1950). Este autor, entretanto, cometeu erro histórico ao afirmar que os nomes Oxalá, Xangô, etc. seriam provenientes de um "setenário nagô", algo que nunca existiu.
2- https://jedarib.blogspot.com/2018/10/as-viagens-de-matta-e-silva.html

terça-feira, outubro 30, 2018

As "viagens" de Matta e Silva

(Edmar Arantes)

A primeira vez que ouvi falar sobre o escritor umbandista W. W. da Matta e Silva (1917-1988) foi através do extinto site Aumbhandam (aumbhandam.org.br), lá pelos idos de 2003. Anos depois, creio que em meados de 2008, lendo rasgados elogios do Marcelo Del Debbio ao "mestre", renovado interesse em conhecer a doutrina de Matta e Silva invadiu-me. Mas só fui travar contato direto com uma obra dele no início de 2013, quando então adquiri a 3a. edição (a definitiva, de 1969) de seu aclamado livro "Umbanda de todos nós".

Que decepção!...

Logo na apresentação da obra já observamos vislumbres dos despautérios que se seguiriam.

Por exemplo, pondo-se acima do Bem e do Mal, e colocando o que ele chama de Umbanda (ou Lei de Umbanda) como o non plus ultra em termos religiosos, Matta e Silva faz afirmações verdadeiramente lunáticas, impossíveis de serem checadas:

... os cultos africanos e suas práticas, ... há vários séculos, na própria África, perderam contato com sua "fonte original", ... que sempre se chamou UMBANDA (p. 7)

Verdadeiramente, do Seio da Religião Original, isto é, desta Lei que se identifica como de UMBANDA, é que nasceram todas as demais expressões religiosas (p. 14)

Porque UMBANDA é, em realidade, Lei, Expressão e Regra da chamada “Palavra Perdida” ... (p. 15)

Por fim, já no final da Apresentação, fazendo ligeiras referências à lendária Agartha, afirma:

... este vocábulo – UMBANDA – vem do “alfabeto divino” existente neste mesmo centro chamado Agartha (p. 16)

Só poderíamos terminar como os portugueses: DURMA-SE COM UM BARULHO DESSES!

(Pretendo continuar com este assunto em novas postagens)

sexta-feira, outubro 26, 2018

Curiosidades sobre a editora Livraria Freitas Bastos

(Edmar Arantes)

Em minhas pesquisas sobre a construção da literatura espiritualista no Brasil, realizadas desde há quase 15 anos, logo me deparei com uma editora realmente sui generis neste sentido. Trata-se da Livraria Freitas Bastos S/A, que a partir de 1960 "abraçou" vários espiritualistas "novidadeiros", portadores de evidente megalomania: Huberto Rohden (ex-padre católico, criador da Filosofia Univérsica), W. W. da Matta e Silva (propagador da chamada Umbanda Esotérica), o médium Hercílio Maes (que divulgava "informações" pra lá de extravagantes psicografando Ramatis), Diamantino Coelho Fernandes (que se achava a reencarnação do apóstolo Thiago e acreditava receber mensagens do Espírito de Maria de Nazareth)... Isso sem falar em Osvaldo Polidoro (fundador do Divinismo e que se dizia reencarnação de Allan Kardec), do qual a editora publicou ao menos uma obra ("Programa Divino e Curas Espíritas", 1965).

Reza a lenda que Yokaanam (Oceano de Sá) também andou flertando com a editora-livraria, mas esse era louco demais. Após 2 anos de espera para a publicação de um livro seu cujos originais foram deixados lá (a informação consta da 2a. ed. da obra "Yokaanam Fala à Posteridade", publicada em 1970), desfez o contrato com a editora, que, segundo ele, em represália ligou para todas as livrarias da Guanabara (antigo estado do Brasil, que existiu no território do atual município do Rio de Janeiro) solicitando que não aceitassem editar seus livros... Se é verdade o fato, não sei. Fica aí o registro...
*

A seguir, algumas curiosidades editoriais relacionadas à Livraria Freitas Bastos:

1959
-- Conforme consta do colofão de "A Sobrevivência do Espírito" (Ed. Divino Mestre, 1959), compunha e imprimia, o que indica que nesta época possuía parque gráfico próprio

1960
-- Publica, de Huberto Rohden, "O Sermão da Montanha", "Novos Rumos para a Educação" (2a. ed) e "O Espírito da Filosofia Oriental" (3a. ed.), além da 2a. ed. de "Umbanda de Todos Nós", de W. W. da Matta e Silva
-- Duas lojas, localizadas nos seguintes endereços: R. Sete de Setembro, 111 (Rio), e R. 15 de Novembro, 62/66 (S. Paulo)

1968
-- Mudança no endereço da loja do Rio: R. Sete de Setembro, 113 (cf. "Magia de Redenção", 1968)
-- Conforme colofão da obra referida acima, subentende-se que continuava a compor e imprimir, e isto até pelo menos fins de 1971 (cf. "Amazônia: perfis industriais", 1971)
-- Mudança no lôgo (cf. o já citado "Magia de Redenção", 1968, mas pode ter ocorrido antes, só que após 1964, visto que a 1a. ed. "Elucidações do Além", publicada nesse ano, ainda apresentava o anterior)

1973 (agosto)
-- Outra mudança de endereço no Rio: agora, R. Sete de Setembro, 127/129 (cf. 2a. ed. de "Doutrina e Aplicação do Direito Tributário", 1973)
-- Já terceirizava a composição e impressão (cf. obra acima citada)

1974 (julho)
-- Lôgo na lombada (verifiquei na 4a. ed. de "Umbanda de Todos Nós", de 1974, mas pode ter ocorrido antes, desde que após 1969, pois nesse ano, na 3a. ed. da citada obra, não aparecia)
-- Ficha catalográfica (verifiquei na 4a. ed. de "Umbanda de Todos Nós", de 1974, mas pode ter passado a constar nos livros antes, só que após 1970, pois na 1a. ed. de "Macumbas e Candomblés na Umbanda", publicada nesse ano, ainda não constava)

1982
-- Mais uma loja, no Rio, situada à R. Maria Freitas, 110-A (cf. 4a. ed. de "A Vida além da Sepultura", 1982)

1985
-- Mais outra loja, agora em S. Paulo: R. Domingos de Morais, 2414 (cf. 5a. ed. de "O Sublime Peregrino", 1985)

1991
-- Já não consta a loja acima referida, mas as outras continuam (cf. 3a. ed. de "A Rosa e o Espinho", 1991), e isto até 1995 (cf. 4a. ed. de "Mensagens do Grande Coração", 1995)

1997
-- Apresentava apenas um endereço: Av. Londres, 381, CEP 21041-030, Bonsucesso, Rio de Janeiro, RJ (cf. ed. de 1997 de "Jesus e a Jerusalém Renovada")

sábado, dezembro 26, 2015

José Ribeiro, "o novo rei do candomblé"

Pouco há na internet sobre José Ribeiro de Souza, mais conhecido apenas como José Ribeiro, falecido babalorixá, escritor, professor de línguas sudanesas e intérprete e compositor de músicas folclóricas e afro-brasileiras. Em pesquisa realizada em março de 2013 nas fichas do Catálogo de Livros da Biblioteca Nacional, descobri que nascera em 1930. Em outra pesquisa realizada nessa época, encontrei também que José Ribeiro teria sido filho (de santo) de Joãozinho da Gomeia, "o rei do candomblé", e que, após a morte deste, em março de 1971, teria tomado para si o título, passando a se denominar "o novo rei do candomblé". Esta denominação encontra-se registrada, por exemplo, em seu LP "No reino de Angola", lançado naquele ano.

Publicou seus livros principalmente pelas editoras Espiritualista e Eco (vide um post sobre elas aqui).

Na edição de 16/01/1975 do jornal Correio Braziliense, saiu uma matéria sobre José Ribeiro:
Apesar de se falar na matéria em 25 livros publicados por ele até jan/1975, encontramos apenas 23 obras publicadas por José Ribeiro até tal data, conforme a seguir:
1) Candomblé no Brasil (Espiritualista, 2a. ed., 1957)
2) Orixás africanos (Espiritualista, 1961)
3) Comida de santo e oferendas (Folha Carioca, 1962)
4) 400 pontos riscados e cantados na umbanda e candomblé (Folha Carioca, 1962)
5) Dicionário africano de umbanda (Aurora, 1963)
6) O jogo dos búzios (Aurora, 1963)
7) Amalás (Espiritualista, 2a. ed., 1969)
8) Omulu - o senhor do cemitério (Espiritualista, 1969)
9) Pontos cantados nos candomblés (Espiritualista, 1969)
10) O ritual africano e seus mistérios (Espiritualista, 1969)
11) As festas dos eguns (Eco, 1969?)
12) O poder das ervas na umbanda (Eco, 1969?)
13) Cerimônias da umbanda e do candomblé (Eco, 1969?)
14) Oxalá - o médium supremo (Espiritualista, 1970)
15) Pomba Gira - mirongueira (Espiritualista, 1970)
16) Brasil no folclore (Aurora, 1970)
17) Magia africana (Espiritualista, 1972)
18) Culto malê (Espiritualista, 1973)
19) Tranca Ruas das Almas, com Decelso (Eco, 1974)
20) Catimbó de Zé Pilintra (Espiritualista, 1974)
21) No reino de Angola (Espiritualista, s/d)
22) Tambores d'África (Espiritualista, s/d)
23) Mirongas de preto velho (Espiritualista, s/d)

Mais tarde, José Ribeiro lançaria ao menos 5 títulos pela editora Pallas: "Eu, Maria Padilha" (1977), "Magia do candomblé" (1985), "Mágico mundo dos orixás" (1988), "O jogo de búzios e as cerimônias esotéricas dos cultos afro-brasileiros" (1990) e "Catimbó - magia do Nordeste" (1991).

Nota: este post foi atualizado em nov/2023.

domingo, março 10, 2013

As primeiras editoras de livros de umbanda

(Edmar Arantes)

Dando de certa forma continuidade à postagem anterior, em que tratamos dos primeiros livros umbandistas, iremos nesta fornecer alguns lances a respeito das primeiras editoras que passaram a publicar regularmente títulos de umbanda, que foi o assunto que de fato nos levou à pesquisa ali apresentada.

Até o fim da década de 40 não havia ainda editora que publicasse regularmente tais títulos. Os que tinham sido lançados até então se enquadravam em três classes: publicações independentes, lançadas à custa do autor ou da tenda ou entidade à qual ele estivesse filiado; lançamentos pelo selo "Biblioteca Espiritualista Brasileira", e umas poucas exceções lançadas de fato por editoras (como a 3a. ed. de "Umbanda", obra de João de Freitas, e a 1a. ed. de "Trabalhos de Umbanda, ou Magia Prática", de Lourenço Braga, títulos lançados pela tradicional Editôra Moderna, do Rio de Janeiro). Foi somente em 1950 que uma empresa editorial resolveu abrir suas portas para autores de livros sobre umbanda e publicar regularmente títulos da área. Falamos da Gráfica Editôra Aurora Ltda., então dirigida por Ernesto Mandarino e localizada à Rua Vinte de Abril, 16, Rio de Janeiro. O primeiro autor do ramo ali publicado foi, ao que tudo indica, Oliveira Magno.

É curioso observar que, talvez pelo preconceito ainda existente àquela época para com tais títulos, até 1953 raramente o nome da editora aparecia na capa dos livros, e só vamos descobrir que a Gráf. Ed. Aurora, além de ter impresso os livros, também atuou como editora, através da leitura dos prefácios ou "post-fácios" destes.

Em 1954, a Aurora lançou a Coleção Espiritualista, que seria, quase toda, constituída de livros umbandistas. Vejamos a listagem dos livros desta coleção até seu número 19:

1 - "A Umbanda e seus Complexos" (Oliveira Magno, 3a. ed., 1954)
2 - "Magia Prática Sexual" (Oliveira Magno, 2a. ed., 1954)
3 - "Umbanda" (Florisbela M. de Sousa Franco, 2a. ed., 1954)
4 - "As Mirongas de Umbanda" (Byron Tôrres de Freitas e Tancredo da Silva Pinto, 1954)
5 - "Lições de Umbanda" (Samuel Pönze, 1954)
6 - "Práticas de Umbanda" (Oliveira Magno, 3a. ed., 1954)
7 - "Doutrina e Ritual de Umbanda" (Byron Tôrres de Freitas e Tancredo da Silva Pinto, 2a. ed., 1954)
8 - "Utilidades Astrológicas" (Oliveira Magno, 1954)
9 - "Lex Umbanda" (Ab'd 'Ruanda, 1954)
10 - "O Espiritismo no Conceito das Religiões e a Lei de Umbanda" (Aluizio Fontenelle, 2a. ed., 1954)
11 - "Banhos e Defumações na Umbanda" (Ab'd 'Ruanda, 1954)
12 - "Alquimia de Umbanda" (Silvio Pereira Maciel, 3a. ed. [1], ?)
13 - "Umbanda e Ocultismo" (Oliveira Magno, 2a. ed., ?)
14 - "Ritual Prático de Umbanda" (Oliveira Magno, 2a. ed., 1956)
15 - "A Umbanda Esotérica e Iniciática" (Oliveira Magno, 3a. ed., 1956)
16 - "Fôrças ocultas, luz e caridade" (J. Dias Sobrinho, 3a. ed., 1956)
17 - "Umbanda Mista" (Sylvio Pereira Maciel, 2a. ed., 1957)
18 - "Umbandismo" (Antônio Alves Teixeira "Neto", 1957)
19 - "Camba de Umbanda" (Byron Tôrres de Freitas e Tancredo da Silva Pinto, 1957)

Curiosamente, o n. 20 desta coleção ("A Umbanda Através dos Séculos", de Aluízio Fontenelle, 2a. ed., 1957) seria publicado por outra editora, a nascente Editôra Espiritualista Ltda., localizada à Rua Frei Caneca, 19, Rio de Janeiro, assim como pelo menos outros três: os números 24 ("Candomblé no Brasil", de José Ribeiro, 2a. ed., 1957), 25 ("Codificação da Lei de Umbanda - Parte científica e Parte prática", de Emanuel Zespo, 2a. ed., 1960) e 26 ("Umbanda para os médiuns", de Florisbela Maria de Souza, 1960) [2], o que mostra que a Ed. Espiritualista mantinha íntimas relações empresariais com a Gráf. Ed. Aurora. Além disso, a partir de 1958 a Ed. Espiritualista passou a republicar títulos da Coleção Espiritualista antes publicados pela Aurora, assim como algumas obras maçônicas e outras tidas como de ciências ocultas antes publicadas por essa editora ("A maçonaria e a grandeza do Brasil", "A mão e seus segredos", "Um pouco de astrologia", etc.). Em contrapartida, a Gráf. Ed. Aurora republicou pelo menos um título já editado pela Espiritualista: "A Umbanda Através dos Séculos", 3a. ed. [3], 1963. É interessante constatar também que este foi o último ano em que livros umbandistas saíram pela Aurora, assim como o último ano da gráfica-editora no endereço citado no início deste texto. A partir de 1964, curiosamente, a Gráf. Ed. Aurora passou a se localizar no mesmíssimo endereço da Ed. Espiritualista (farei uma ilação sobre isso ao fim deste texto). Esta última, a partir desse mesmo ano (e até o término de suas atividades [4]), seguiu com praticamente uma única concorrente no mercado editorial de livros umbandistas, sobre a qual falaremos a seguir.

Foi em 1963 que apareceram os primeiros títulos do selo Editôra Eco [5]. Fundada por Ernesto Emanuele Mandarino, que supomos ser filho do outro, desde o seu início publicou títulos de umbanda, principal segmento da editora. Inicialmente localizada à Rua do Senado, 320 - Conj. 407 - Rio de Janeiro, GB, em meados de 1966, já como nome-fantasia da Livraria Editôra Mandarino Ltda. para a publicação de títulos de umbanda e candomblé, vamos encontrá-la na Rua Marquês de Pombal, 172 - sobreloja 1 - Rio de Janeiro, GB.

A livraria-editora possuía filial no número 171-B da rua citada, conforme pode-se constatar das informações editoriais da obra "Os orixás e o candomblé", de 1967. Em 1970 o logo da editora foi modificado e seu endereço principal passou a ser aquele onde antes era o da filial, R. Marquês de Pombal, 171-B, Rio de Janeiro (compare-se frontispício da obra "Despachos e oferendas na umbanda", de 1969, com página de dados editoriais de "O que é a umbanda", obra de 1970). Em 1973, porém, o endereço da matriz volta a ser R. Marquês de Pombal, 172, Rio de Janeiro, conforme podemos observar da 2a. ed. de "O livro (completo) do feiticeiro Athanásio" e da 3a. ed. de "Pomba-Gira". Mais tarde, a livraria-editora passa a se chamar apenas Editora Mandarino Ltda., com os endereços mantidos (matriz no número 172, sblj., e filial no 171-B), e isso até pelo menos 1990, conforme pode ser visto aqui. A editora foi baixada em 31/12/2008 por inaptidão [6]. (Trecho modificado nos dias 27/05/2020 e 01/06/2021)

Sobre a "coincidência" entre o fim da publicação de títulos umbandistas pelo selo Aurora, a mudança de endereço da Gráf. Ed. Aurora para o da Ed. Espiritualista e o início das atividades da Ed. Eco, tudo ocorrido em meados de 1963, a ilação que faço é que, tendo falecido naquele ano Ernesto Mandarino, então diretor da Gráf. Ed. Aurora, esta fora comprada pela Ed. Espiritualista, passando a funcionar em seu endereço. (A marca Aurora ficou restrita a livros não espiritualistas.) Além disso, dando de certa forma continuidade ao trabalho de Ernesto Mandarino, seu filho Ernesto E. Mandarino fundou a Ed. Eco, como já dito.

_________
1- Esta edição constou erroneamente como 2a. na capa da obra, mas a 2a. ed. verdadeira é de 1951.
2- Os números 21 ("Exu", de Aluízio Fontenelle, 3a. ed., 1957) e 28 ("Do batuque e das origens da Umbanda", de Leopoldo Bettiol, 1963) foram publicados pela Gráf. Ed. Aurora.
3- A edição seguinte desta obra (4a., de 1971) foi publicada novamente pela Ed. Espiritualista.
4- Conforme pode ser constatado aqui, em 1998 ainda reeditava livros, mas a publicação de títulos exclusivamente umbandistas pela editora cessou em meados da década de 80 ou no início da década de 90. (Nota de 25.10.15)
5- Então Edições Eco. O nome Editôra Eco apareceria somente no ano seguinte, 1964.
6- Conforme http://empresasdobrasil.com/empresa/editora-mandarino-ltda-34026245000100 (nota: há erro na fornecida data do registro da empresa, 02/06/1972, pois em 1967 ela já funcionava). Curiosidades: (1) após "Sonata Cósmica", livro publicado em 1995 onde aparece o endereço R. Marquês de Pombal, 171-B (não 172), não constou qualquer forma de contato para com a editora em suas publicações; (2) 1998 foi o último ano que a Eco lançou livros novos (a partir de 1999 todas as suas publicações foram reedições); (3) continuaram saindo livros sob o selo "Editora Eco" mesmo após a Ed. Mandarino Ltda. ter sido baixada.

domingo, fevereiro 10, 2013

Os primeiros livros umbandistas

(Edmar Arantes)

Não sendo umbandista, mas interessado em saber as primeiras editoras que abriram suas portas a títulos da área, iniciei em fins de março de 2011 um levantamento sobre antigos livros de umbanda. No início de abril do mesmo ano, tendo adquirido História da Umbanda -- uma religião brasileira, livro de Alexandre Cumino publicado pela Ed. Madras em 2010 (doravante "Cumino, 2010"), e folheando algumas de suas páginas, notei que a grande maioria dos livros levantados já se encontrava citada ali, apesar de discrepâncias nas datas de publicação original de algumas obras, o que será explicitado adiante. No fim daquele mesmo mês de abril, ainda adquiri A Construção Histórica da Literatura Umbandista, livro de Diamantino Trindade publicado pela Ed. do Conhecimento em 2010 (doravante "Trindade, 2010"), que, sobre os primeiros anos da literatura umbandista, não trouxe nenhum novo autor além daqueles citados por Cumino. Depois disso, praticamente esqueci o assunto, e deixei o levantamento arquivado em meu computador pessoal. Fim do mês passado (jan/2013), entretanto, meu interesse foi novamente despertado para a questão, e continuei então o trabalho interrompido em abril de 2011, "finalizando-o" há alguns poucos dias (as aspas são propositais, pois trabalhos deste tipo nunca estão de fato fechados), e estou agora a apresentá-lo para os leitores que aqui aportarem.

Como ficará claro da listagem que será apresentada, diferentemente do que foi afirmado por [Trindade, 2010, p. 42], após o "Primeiro Congresso do Espiritismo de Umbanda" (1941) a publicação de títulos umbandistas seguiu de forma acanhada, e somente a partir do início da década de 50 houve de fato uma "rápida proliferação de livros de escritores umbandistas".

A apresentação dos livros a seguir será dividida em 3 partes: "Os primeiros títulos (1925-1941)", "De 1942 a 1949" e "De 1950 a 1955". Consideramos como elemento divisor das duas primeiras partes o já referido "Primeiro Congresso do Espiritismo de Umbanda", ocorrido no Rio de Janeiro em outubro de 1941. Já a separação entre os dois últimos períodos foi considerada levando-se em conta o ano (1950) em que foi iniciada a publicação de títulos dedicados exclusivamente à apresentação de uma umbanda esotérica e iniciática, devidos ao escritor Oliveira Magno. E consideramos 1955 como o fim do terceiro período porque em 1956(1) temos um verdadeiro divisor de águas no que diz respeito à literatura umbandista: o livro Umbanda de Todos Nós, de W. W. da Matta e Silva. A obra, publicada a expensas do autor naquele ano, foi uma verdadeira revolução no mundo literário umbandista.

Na listagem abaixo, dentro de um mesmo ano de publicação a sequência apresentada seguirá pela ordem alfabética do primeiro substantivo aparecido nos títulos, afora casos em que conhecemos a ordem cronológica real.

*

Os primeiros títulos (1925-1941)

No Mundo dos Espíritos. LEAL DE SOUZA, Rio de Janeiro: Officinas Graphicas de "A Noite" (impressor), 1925. (Coletânea de artigos publicados pelo autor no jornal "A Noite" em 1924.) --- Nota: esta obra só foi aqui inserida por ter sido a primeira que se tem notícia que registrou o termo "umbanda", mas ela não é propriamente um livro umbandista.

O Espiritismo, a Magia e as Sete Linhas de Umbanda. LEAL DE SOUZA, Rio de Janeiro: Officinas Graphicas do Liceu de Artes e Oficios (impressor), 1933. (Compilação de crônicas publicadas no jornal "Diário de Notícias" em 1932.)

A Magia no Brasil. WALDEMAR L. BENTO, Rio de Janeiro: Oficinas Graficas do Jornal do Brasil (impressor), 1939.

Catecismo Espiritualista da Linha Branca de Umbanda. A. G. ANSELMO, Rio de Janeiro: Oficinas Graficas do Jornal do Commercio (impressor), 1940.

Umbanda em revista -- reportagens, entrevistas, commentarios. JOÃO DE FREITAS, [Rio de Janeiro]: s.ed.(2), 1941(3). --- Nota: em sua 2a. ed., publicada em 1942, e ainda de maneira independente, esta obra passou a se chamar Umbanda -- rituais, reportagens, entrevistas, comentários, etc. Já em sua 3a. ed., que não apresentou ano de saída, o livro foi publicado pela tradicional Editôra Moderna.

- - -

De 1942 a 1949 (*)

Primeiro Congresso do Espiritismo de Umbanda. VÁRIOS AUTORES. Rio de Janeiro: Oficinas Graficas do Jornal do Commercio (impressor), 1942. (Anais do Primeiro Congresso do Espiritismo de Umbanda, ocorrido em outubro de 1941 no Rio de Janeiro.)

Umbanda (Magia Branca) e Quimbanda (Magia Negra). LOURENÇO BRAGA, Rio [de Janeiro]: Livraria Jacintho(4) (distribuidor), 1942. (Trabalho dito apresentado no Primeiro Congresso do Espiritismo de Umbanda mas não publicado na obra acima referida.)

O culto de Umbanda em face da Lei. Biblioteca Espiritualista de Umbanda. Rio de Janeiro: União Espiritualista Umbanda de Jesus -- UEUJ, 1944.

Os Mistérios da Magia (romance). LOURENÇO BRAGA, Rio de Janeiro: Asa Artes Gráficas (impressor), 1945(5).

Coleção Afro-Brasileira (Urubatão, deus da guerra; Aimoré, deus da caça; Iára, deusa do mar; Caramuru, deus do trovão -- livretes de 32 páginas cada). HERALDO MENESES, [Rio de Janeiro]: s. ed., 1946. --- Nota: mais tarde esta coleção foi republicada em volume único sob o título Caboclos na Umbanda.

Primeiras revelações de Umbanda. ORDEM DOS CAVALEIROS DA GRAN CRUZ, Escola Técnica de Curitiba (impressor), 1946.

Trabalhos de umbanda; ou, Magia Prática. LOURENÇO BRAGA, Rio de Janeiro: Editôra Moderna, 1946(6).

O que é a Umbanda?(7,8). EMANUEL ZESPO (pseudônimo de Paulo Menezes), [Rio Grande?]: s. ed., 1946.

Ritual de Umbanda. BENEDITO RAMOS DA SILVA, Rio de Janeiro, 1948.

Alquimia de Umbanda. SYLVIO PEREIRA MACIEL. Pôrto Alegre: Editôra Coruja, 1949(9). (Livro deslocado para esta fase em 27/05/2021 por termos encontrado uma edição mais antiga do que a que pensávamos ser a original.)

Umbanda. Biblioteca Espiritualista Brasileira. FLORISBELA MARIA DE SOUZA FRANCO, Rio de Janeiro: Oficinas Graficas do Jornal do Commercio (impressor), 1949(10).

(*) As obras Pai José (romance) e Lei de Umbanda (romance), de EMANUEL ZESPO, também publicadas neste período, não foram alocadas acima por não termos conseguido encontrar o ano de seus lançamentos. ~ O compilador.

- - -

De 1950 a 1955

Fôrças ocultas, luz e caridade. J. DIAS SOBRINHO, Rio de Janeiro: s.ed., 1950(11).

A Umbanda e seus complexos. OLIVEIRA MAGNO, Rio de Janeiro: s.ed., 1950.  --- Nota: a 3a. edição desta obra, publicada pela Gráf. Ed. Aurora em 1954, inaugurou a Coleção Espiritualista, lançada pela referida editora.

A Umbanda esotérica e iniciática. OLIVEIRA MAGNO, Rio de Janeiro: s.ed.(12), 1950.

Codificação da Lei de Umbanda (Parte científica). EMANUEL ZESPO, Rio de Janeiro: Gráf. Ed. Aurora, 1951(13).

Doutrina e Ritual de Umbanda. BYRON TORRES DE FREITAS & TANCREDO DA SILVA PINTO. Rio de Janeiro: s.ed.(14)1951.

O Espiritismo no conceito das religiões e a Lei de Umbanda. ALUIZIO FONTENELLE, Rio de Janeiro: Gráf. Ed. Aurora, 1951.

Pratica de Umbanda. OLIVEIRA MAGNO, Rio de Janeiro: [Gráf. Ed. Aurora?], [1951?]. --- Nota: em sua 3a. ed., de 1954, este livro foi reeditado como Práticas de Umbanda e entrou como vol. 6 na Coleção Espiritualista, já mencionada acima.

Umbanda mista. SYLVIO PEREIRA MACIEL, Rio de Janeiro: s.ed.(15), 1951.

Evangelho de Umbanda: escrituras. O solitário da Academia Eclética Exotérica (YOKAANAM). Rio de Janeiro: Fraternidade Eclética Espiritualista Universal (FEEU), 1952(16).

Exu. ALUIZIO FONTENELLE, Rio de Janeiro: s.ed.(17), 1952(18).

A Umbanda através dos séculos (póstumo). ALUIZIO FONTENELLE, Rio de Janeiro: Organização Simões(19), 1953(20).

Umbanda e Ocultismo. OLIVEIRA MAGNO, Rio de Janeiro: Gráf. Ed. Aurora(21)1953(22).

Codificação da Lei de Umbanda (Parte prática). EMANUEL ZESPO, Rio de Janeiro: Gráf. Ed. Aurora, 1953.

O Esoterismo de Umbanda, OSÓRIO CRUZ, Rio de Janeiro: s.ed., 1953.

A Nova Lei Espírita: Jesus, a Chave de Umbanda. MARIA TOLEDO PALMER, Rio de Janeiro: s.ed., 1953.

Ritual Prático de Umbanda. OLIVEIRA MAGNO, Rio de Janeiro: Gráf. Ed. Aurora, 1953.

Umbanda e Pais-de-Santo. CÉSAR CÂNDIDO DE LEMOS, Belo Horizonte: Ed. Itatiaia, 1953.

Umbanda e seus Cânticos. JOÃO SEVERINO RAMOS, Rio de Janeiro: Tenda Espírita São Jorge, 1953.

Umbanda Sagrada e Divina. PAULO GOMES DE OLIVEIRA, Rio de Janeiro: Ed. Aurora, [1953?].

As Mirongas de Umbanda. Coleção Espiritualista n. 4. BYRON TORRES DE FREITAS & TANCREDO DA SILVA PINTO, Rio de Janeiro: Gráf. Ed. Aurora, 1954(23).

Lições de Umbanda. Coleção Espiritualista n. 5. SAMUEL PÖNZE, Rio de Janeiro: Gráf. Ed. Aurora(24), 1954.

Lex Umbanda (Catecismo). Coleção Espiritualista n. 9. AB'D 'RUANDA, Rio de Janeiro: Gráf. Ed. Aurora, 1954. --- Nota: até sua 3a. ed., já publicada pela Ed. Espiritualista, esta obra permaneceu com o nome referido, mas em alguns exemplares dessa mesma edição, e nas edições seguintes, passou a ter como título Catecismo de Umbanda (Lex Umbanda).

Banhos e defumações na Umbanda. Coleção Espiritualista n. 11. AB'D 'RUANDA, Rio de Janeiro: Gráf. Ed. Aurora, 1954.

No limiar de Umbanda. Vol. 4 da Biblioteca de Umbanda. ZINA SILVA, Rio de Janeiro: Organização Simões, 1954.

A Umbanda perante a crítica. LEOPOLDO BETTIOL, Porto Alegre: Livraria Olímpia, 1954.

As impressionantes cerimônias da Umbanda. BYRON TORRES DE FREITAS & TANCREDO DA SILVA PINTO, Rio de Janeiro: Editora Souza, 1955.

Xangô Djacutá. JOÃO DE FREITAS, Rio de Janeiro: Editora Souza, 1955(25).

*

(Caso você, leitor, queira transcrever a listagem acima apresentada, por favor, cite a fonte. Levantamento bibliográfico também é pesquisa.)

Conclusão: como pode ser constatado do exposto, a principal editora que impulsionou as publicações de umbanda na primeira metade da década de 50 foi a Ed. Aurora, que sequer foi mencionada dentre aquelas alocadas na nota de rodapé 166 (pág. 220) de [Cumino, 2010]! Além disso, duas das editoras ali citadas (Ed. Espiritualista e Ed. Eco) nem mesmo existiam até 1955... Do que sabemos, a primeira -- responsável pela continuação do lançamento dos títulos da Coleção Espiritualista a partir de meados de 1957, oscilando com a Ed. Aurora na publicação de tais títulos a partir de então -- surgiu nesse ano, e a Ed. Eco -- responsável pela publicação de importantes obras como Umbanda dos Pretos Velhos, de Antônio Alves Teixeira Neto, em 1965(26); Umbanda de Caboclos, de Decelso, em 1967(27); Okê Caboclo!, de Benjamin Figueiredo, em 1968(28), e O que é a umbanda, de Cavalcanti Bandeira, em 1970(29) --, por volta de 1963.

_____________________
1- Cumino, em História da Umbanda, também utiliza o referido ano como um divisor de águas para a literatura umbandista, e deixa de fazer considerações sobre obras na sequência, mas, curiosamente, limita-se a dizer que "a partir de 1956, fica mais evidente uma segunda geração de autores que trabalham com bibliografia fundamentada em títulos de Umbanda; no entanto, as teorias da primeira geração vão aparecer nessas obras sem citação regular ou créditos autorais" [Cumino, 2010, p. 271]... Será que este proceder foi honesto? Não nos parece. Aliás, Matta e Silva não é mencionado uma única vez no livro! Nem mesmo quando o autor trata de citar "alguns autores umbandistas dedicados e de primeira linha nessa segunda geração" [ibid.], o que mostra que Cumino não considera Matta e Silva um autor dedicado e de primeira linha... Se o motivo para deixar de fazer considerações sobre a literatura umbandista a partir de 1956 fosse o fato de teorias da primeira geração aparecerem, nas obras então publicadas, sem citação regular ou créditos autorais, Cumino deveria ter parado em 1951, quando foi publicada "Doutrina e Ritual de Umbanda", obra de Byron Torres de Freitas e Tancredo da Silva Pinto, vez que, como ele mesmo observa [Cumino, 2010, p. 247], os autores utilizam-se de ideias trabalhadas no Primeiro Congresso do Espiritismo de Umbanda e nas obras de Emanuel Zespo e Oliveira Magno sem citação regular ou créditos autorais... Parece então que ele deixou de pontuar sobre a literatura umbandista a partir de 1956 simplesmente para evitar fazer considerações sobre a obra de Matta e Silva. Bem, se assim é, esperamos, por questão de simples honestidade intelectual -- virtude essencial para todos que se metam a fazer trabalhos históricos --, que numa próxima edição de História da Umbanda, caso houver, o autor trate de dizer com todas as letras o que pensa sobre Matta e Silva, ainda que sob a forma de ácida crítica. O que não caiu nada bem, a nosso ver, foi essa singular omissão de um autor tão considerado por certa linha de umbandistas. -- Nota atualizada em 02/06/2021 (voltar)
2- [Trindade, 2010, pp. 42 e 264] apresenta erroneamente a Ed. Espiritualista -- que nem existia em 1941! -- como a responsável pela publicação deste livro. (voltar)
3- [Cumino, 2010] apresenta ora 1938 (p. 94), ora 1939 (p. 225), como ano de lançamento deste livro. (voltar)
4- [Trindade, 2010, pp. 47 e 263] apresenta erroneamente uma tal editora São José como a responsável pela publicação desta obra. Na pág. 47 também está dito que Lourenço Braga "não havia compreendido que a umbanda era uma religião autônoma e não fazia parte do espiritismo" e que o autor teria afirmado, no livro, que a "umbanda tornou-se conhecida no Brasil através da colonização africana", ignorando que a umbanda é uma religião brasileira. Sobre o primeiro ponto, a questão é outra. O fato é que Braga nem mesmo associou o conceito de religião à palavra "umbanda", preferindo defini-la, ora como "magia branca", ora como uma "organização espiritual". Sobre o segundo ponto, vale dizer que a transcrição não foi feita corretamente. O que Lourenço Braga disse foi o seguinte: "Umbanda" tornou-se conhecida no Brasil através da colonização africana. Sua significação era a seguinte: -- fazer magia, por intermedio das forças invisiveis [...] (Umbanda e Quimbanda, 1942, p. 21). Ou seja, claro está que Braga referia-se à palavra "umbanda", não à religião umbanda, mesmo porque, conforme já dissemos, no livro o autor não utiliza a palavra "umbanda" para designar uma religião. (voltar)
5- [Cumino, 2010, p. 229] apresenta 1953. (voltar)
6- [Cumino, 2010, p. 229] e [Trindade, 2010, pp. 48 e 263] apresentam 1950. (voltar)
7Ao contrário do que consta em [Cumino, 2010, p. 111], em 1946 esta obra ainda não fazia parte da Biblioteca Espiritualista Brasileira, o que só passou a ocorrer a partir de sua 2a. ed., em 1949. (volta) 
8- Em [Trindade, 2010, p. 70] faltou informar que a descrição do livro ali corresponde à 3a. edição da obra. Na mesma página é afirmado que o livro não trouxe nenhuma importante novidade "em relação ao que já havia sido escrito anteriormente", mas, até onde sei, ele foi pioneiro em que registrar a ideia da umbanda como a "Quarta Revelação", e isto é uma importante "novidade", não?... (voltar)
9- [Trindade, 2010, pp. 55 e 265] registra Ed. Espiritualista e 1950... (voltar)
10- [Cumino, 2010, p. 266] registra o ano 1953. (voltar)
11- [Cumino, 2010, p. 234] registra o ano 1949. (voltar)
12- [Trindade, 2010, pp. 51 e 265] registra Ed. Espiritualista... (voltar)
13- [Cumino, 2010, p. 232] não menciona que este volume de Codificação da Lei de Umbanda foi publicado em 1951. (voltar)
14- [Cumino, 2010, pp. 54 e 398] e [Trindade, 2010, pp. 66 e 266] citam Ed. Espiritualista... (voltar)
15- [Trindade, 2010, p. 55] registra Ed. Espiritualista... (voltar)
16- [Cumino, 2010, p. 264] registra 1951... (voltar)
17- [Trindade, 2010, pp. 60 e 264] registra Ed. Espiritualista... (voltar)
18Ibid. registra 1951... (voltar)
19- [Trindade, 2010, pp. 58 e 264] registra Ed. Espiritualista... (voltar)
20- Ibid. registra 1950... (voltar)
21- [Trindade, 2010, pp. 52 e 265] registra Ed. Espiritualista... (voltar)
22- [Cumino, 2010, p. 239] e [Trindade, 2010, pp. 52 e 265] registram 1952... (voltar)
23- [Cumino, 2010, p. 251] registra 1953, que é apenas um ano citado na obra, provavelmente quando foi escrita. (voltar)
24- [Trindade, 2010, pp. 74 e 266] registra Ed. Espiritualista... (voltar)
25- [Cumino, 2010, p. 225] registra década de 40... (voltar)
26- Não conseguimos verificar a informação constante em [Trindade, 2010, pp. 88 e 265] de que esta obra teria sido publicada antes, mas neste mesmo ano, pela Ed. Espiritualista. (voltar)
27- Em [Trindade, 2010, pp. 114 e 264] consta 1972... (voltar)
28- Em [Trindade, 2010, p. 86] consta 1961... (voltar)
29- Em [Trindade, 2010, pp. 134 e 263] consta 1973... (voltar)

domingo, dezembro 23, 2012

Interessantes considerações...

Lendo esta postagem aqui, do Blog do Yuri, e assistindo aos dois vídeos-áudios ali disponíveis, de um diálogo travado em 2006 entre o responsável por aquele espaço, Yuri Vieira, e o filósofo Olavo de Carvalho, não resisti a transcrever alguns trechos para deixar registrado. Então, para conhecimento dos leitores deste blog, segue...

Do primeiro vídeo-áudio (que no YouTube está disponível neste link):

O tal "ecumenismo" é possível? (2:19 - 4:04)

Yuri: -- É o Schuon [Frithjof Schuon] que fala sobre a unidade intrínseca de todas as tradições religosas? É ele?

Olavo: -- Não... Ele  tem um livro, que é um clássico desse estudo de religião comparada, que se chama Da Unidade Transcendente da Religião, e um dos princípios que ele coloca é que só pode existir unidade no sentido de transcendente, não imanente. (...) Então você tem uma unidade do conteúdo metafísico das doutrinas das várias religiões, o que não quer dizer que você tenha uma unidade do ponto de vista ritual, moral, legal, canônico, etc., etc. Essa unidade das religiões no sentido material, no sentido exotérico, pra ele é uma impossibilidade pura e simples. E ele tem toda razão. (...)

Yuri: -- É... E isso, evidentemente, como você disse, se é transcendental, não tem nada a ver com ecumenismo, né?

Olavo: -- Não, não tem nada a ver. (...) Esse negócio de ecumênico, isso aí é um negócio politicamente correto, isso aí é coisa da ONU. (Risos.) Você faz lá um templo em que vale tudo, em que o sujeito vai celebrar missa católica ao mesmo tempo que [pratica] rituais budistas, etc., etc. Daí você entra no reino da confusão. E da politicagem... Na verdade, isso é o mundo do Anti-Cristo, é o mundo da falsificação total.

Racionalismo, moral cristã e os "templos da estupidez humana" (27:08-28:48)

Olavo: -- O que hoje nós conhecemos, por exemplo, como moral católica só obteve uma formulação escrita no séc. XVIII. (...) Então só no séc. XVIII que isso obtém uma formulação organizada e uniforme, na grande obra de Sto. Afonso de Liguori Teologia Moral, que é uma obra de racionalismo, porque Sto. Afonso de Liguori faz, na moral cristã, o tipo de raciocínio dedutivo que vai, vamos dizer, do geral para o particular, exatamente como Spinoza tinha feito na Ética. Então você vê que o modus raciocinandi racionalista deu à moral cristã a sua formulação racional. Pra você ver como essas coisas são, vamos dizer, complicadas... Não são insolúveis, mas têm que ser abordadas com muita seriedade, muita responsabilidade, e, pra isso, a primeira condição é você abandonar esses conceitos, vamos dizer, vulgares, de tomada de posição vulgar, que são alimentados diariamente na mídia e nessas m... de instituições chamadas "universidade", que deveriam ser fechadas todas, porque isso aí é o templo da estupidez humana. (Entendeu?)

A palavra "ateu" (31:49-32:11)

Olavo: -- Olha... mas eu não sei direito, viu, o que é ateu... Essa palavra "ateu", acho uma palavra meio vazia, porque o sujeito tá dizendo que ele não acredita em uma determinada religião, ou ele não acredita em um deus tal como esse deus foi explicado pra ele por uma determinada religião... (Entendeu?) Acho que isso aí tudo não significa nada.

Do segundo vídeo-áudio (que está disponível no YouTube neste link):

Discussões sobre religião, o pensamento epidérmico e a apreensão da realidade, principalmente no Brasil... (0:15-1:20; 2:09-3:06)

Yuri: -- É, então assim, discutir religião é uma coisa extremamente complicada...

Olavo: -- Não, dá pra discutir, mas... Toda discussão tem que ser com base no conhecimento dos fatos, nos dados da experiência. Como as pessoas não têm isso, então elas pegam palavras e imantam essas palavras com um poder mágico, tá entendendo, e discutem em torno das palavras. No Brasil, isso aí é a única coisa que as pessoas sabem fazer. Elas acham que pensar é isto. É você formar uma frase, depois você falar outras frases que confirmam a mesma frase... Quando você "espreme" a frase para saber a que fato da ordem concreta aquilo corresponde, você vê que é impossível.

Yuri: -- Na verdade é uma discussão formal só, né?

Olavo: -- Não, é verbal!... É verbal. São palavras, e as palavras provocam reações emocionais imediatas, sem passar pela representação da realidade, cê tá entendendo? Isso aí é o modo brasileiro de pensar, se é que isto é pensar... Isto pra mim não é pensar, é somente falar. (...) Como no Brasil todo mundo é obrigado a tomar posição já na adolescência, então o sujeito já tem uma série de opiniões que são feitas, construídas, exclusivamente em torno de reações emocionais da palavra. É claro que isto pode acontecer em todo lugar, mas, como no Brasil, não tem. No Brasil só existe isso. Toda discussão pública no Brasil é discussão em torno de palavras imantadas, cê tá entendendo?, e valores emocionais. E só isto. Quer dizer: é discussão de maluco. A coisa tá fora da realidade sempre! Porque, para você ter alguma apreensão da realidade, você precisa justamente, vamos dizer, se desencantar desses aglomerados mágicos de palavras e emoções, e buscar por trás da palavra quais são os fatos concretos, os dados de experiência concreta, a que se referem.

Unidade planetária e globalização (33:57-37:03)

Olavo: -- Eu acho que a unidade planetária não é um problema efetivamente. Por que? Porque nunca existiu, a humanidade "viveu" a sua "vida" inteira em blocos civilizacionais distantes, sem um saber do outro, e funcionou perfeitamente bem. (Entendeu?) Eu acho até que hoje existe um intercâmbio excessivo, cê tá entendendo?, criando problemas insolúveis, né?, a tal da... Na verdade, quando você pensa em globalização... Depois que eu mudei aqui para os Estados Unidos, é que eu... A gente vê que esse negócio de globalização é uma balela! Porque existem abismos entre as nações, abismos intransponíveis! Essa impressão de 'Ah, estamos num universo global, aldeia global' ... conversa mole pra boi dormir! Eu diariamente, mas diariamente!, topo assim com dez expressões idiomáticas inglesas que não têm tradução em português, não têm equivalentes, e que é uma nuança específica deste lugar, desse momento, e que você, com muita convivência, você conseguir pegar, mas não vai conseguir dizer em português, então tá aí um abismo, pô! Isso aí existe aos milhares. Abismo cultural, então... Bom, o Brasil é um país que tem 180 milhões de habitantes, e aqui, nos Estados Unidos, tem 300 milhões. Um não sabe nada do outro, e o outro sabe menos ainda do que acontece aqui. Isso em plena globalização! Então não existe globalização no aspecto cultural. Isso aí é uma bobagem. Globalização quer dizer que tem meia dúzia de "nêgo" aqui que faz negócio com outra meia dúzia de "nêgo" aí. Como esses "nêgo" rico acham que eles são o centro do mundo, eles acham que tá globalizado pra todo mundo. Ah, faz-nos rir... Globalizado pra eles, do ponto de vista econômico. (Cê tá entendendo?) Quer dizer, porque eles começaram a comerciar com pessoas com as quais eles não comerciavam antes eles acham que globalizou tudo? Isso é absolutamente ridículo! Agora, acontece que esses "camarada", eles sempre têm dinheiro pra pagar meia dúzia de intelectuais que escrevem as coisas do jeito que eles acham. E tiram um monte de cópias, distribui pra todo mundo, põe na televisão, põe na Internet, e o idiota acredita... E daí começam a discutir uma nova situação como se a situação existisse. (Cê tá entendendo?) Eu digo: ora, uma situação que existe, por exemplo, uma situação de globalização, ela deveria poder se traduzir em realidades de experiência que são acessíveis a pessoas concretas, e portanto a todas as pessoas que estão dentro dessa civilização supostamente globalizada. Mas eu vejo que os abismos culturais entre nações, eles continuam a existir, e -- pior -- alguns deles ficam mais fundos a cada dia que passa. Entre os Estados Unidos e o Brasil, olha, o abismo é imensurável. Imensurável! Levaria 40 anos pra atualizar o brasileiro mais ou menos do que tá acontecendo aqui, e quando terminasse de atualizar ele já taria com outros 40 anos atrasado...

A honestidade intelectual, o desconstrucionismo e a arte da "escrita vazia" (39:33-40:54)

Olavo: -- E eu acho que, para a formação dos intelectuais, está seria a disciplina número 1: você saber distinguir entre o que você sabe e o que você não sabe. Agora, depois que entrou essa moda desconstrucionista nas universidades, isto estupidificou as pessoas a tal ponto, que elas não sabem mais distinguir entre o que é saber alguma coisa e o que que é conseguir fazer uma frase a respeito. Quando ele consegue fazer uma frase, ele já persuade a si mesmo. E, quando ele diz aquele frase, as pessoas que nunca tinham conseguido fazer aquela frase parecem que descobriram o mundo: 'Ah, então é assim, agora eu descobri a verdade!'... É tudo louco, po...! Agora, eu vi eu mesmo por exemplo escrevendo sobre Economia no ... (eu tinha um ... no Jornal da Tarde ... escrevia sobre ... 30 anos atrás), escrevi um monte de coisa sobre Economia sem saber nada de Economia! Eu sabia que eu não sabia. Mas o público não sabia... Então, a hora que eu percebi como é possível fazer frases sem entender nada do negócio, eu fiquei aterrorizado! Eu falei: então eu posso enganar a mim mesmo com uma facilidade extraordinária... (Você tá entendendo?) E aí que começou a conquista da minha maturidade intelectual, que consiste em distinguir o que eu sei do que eu não sei.

domingo, dezembro 16, 2012

As "doutrinas espíritas" de Kardec

(José Edmar Arantes)

Malgrado o esforço de Kardec no primeiro parágrafo da "Introduction a l'Etude de la Doctrine Spirite" da edição definitiva de Le Livre des Esprits (doravante LE) em tentar definir doctrine spirite de forma condizente com a ideia transmitida por esta expressão na capa do livro e no próprio título da referida introdução (algo como "corpo de conhecimentos transmitido por Espíritos"), alterando "Nous dirons donc que la doctrine spirite ou le spiritisme consiste dans la croyance aux relations du monde matériel avec les esprits ou êtres du monde invisible" (LE, 1857, p. 1) para "Nous dirons donc que la doctrine spirite ou le spiritisme a pour principes les relations du monde matériel avec les Esprits ou êtres du monde invisible" (LE, 1860, item I, p. III), ou seja, mudando "consiste na crença em" para "tem por princípios as" -- mudança esta que, em minha opinião, tornou a frase ininteligível [1] --, não há como fugir do fato de que, em outros trechos da "Introduction a l'Etude de la Doctrine Spirite" (e não são poucos), doctrine spirite continuou a significar o que significava no primeiro parágrafo da versão da "Introduction" na edição de 1857, ou seja, crença espírita (crença na existência de Espíritos e de relações destes com o mundo material).

Até onde sei, Silvino Canuto Abreu (1892-1980) -- um dos maiores intelectuais espíritas que já passou por este país, talvez o maior -- foi o único a ressaltar explicitamente que doctrine, em certos pontos da "Introduction a l'Etude de la Doctrine Spirite", tem o sentido de crença. E como é bem possível que muitos não tenham tomado contato com a obra na qual este "aviso" se encontra (O Primeiro Livro dos Espíritos [2], doravante PLE), seja por falta de oportunidade, seja por desprezo mesmo, estamos a reiterá-lo aqui, e o ilustraremos com alguns trechos da referida introdução nos quais doctrine spirite tem o sentido de crença espírita, o que poderá ser melhor aferido lendo-se mais do contexto em que estão inseridos. Dito isto, vamos aos trechos...

--- "Nous avons cru devoir insister d'autant plus sur ces explications que la doctrine spirite repose naturellement sur l'existence en nous d'un être indépendant de la matière et survivant au corps." (LE, 1857, p. 4; LE, 1860, item II, p. VI)

"Pareceu-nos dever insistir um tanto demais nesta explicação porque a Crença Espírita repousa forçosamente na existência em nós de um ser independente da matéria corpórea e sobrevivente ao corpo." (PLE, 1957, p. 4)

-- "La doctrine spirite, comme toute chose nouvelle [3], a ses adeptes et ses contradicteurs. Nous allons essayer de répondre à quelques-unes des objections de ces derniers, en examinant la valeur des motifs sur lesquels ils s'appuient, sans avoir toutefois la prétention de convaincre tout le monde, car il est des gens qui croient que la lumière a été faite pour eux seuls. [...]" (LE, 1857, p. 4; LE, 1860, item III, p. VII)

"A Crença Espírita, como toda idéia nova, tem seus adeptos e contraditores. Vamos tentar responder aqui a algumas das mais comuns objeções destes últimos, examinando o valor dos motivos alegados e nos quais se apoiam, sem todavia ter a pretensão de convencer tôda a gente, mesmo porque há certas pessoas que supõem ter o Sol nascido somente para elas. [...]" (PLE, 1957, p. 4)

-- "Est-il d'ailleurs besoin d'un diplôme officiel pour avoir du bon sens, et ne compte-t-on en dehors des fauteuils académiques que des sots et des imbéciles? Qu'on veuille bien jeter les yeux sur les adeptes de la doctrine spirite, et l'on verra si l'on n'y rencontre que des ignorants, et si le nombre immense d'hommes de mérite qui l'ont embrassée permet de la reléguer au rang des croyances de bonnes femmes. [...] (LE, 1857, p. 15; LE, 1860 [4], item VII, p. XXI)

"Será porventura necessário diploma oficial para se ter bom senso, e só se contam fora das cátedras acadêmicas pacóvios, paspalhões, tolos e imbecis? Queiram os zoilos lançar o olhar justo sobre os Adeptos da Crença Espírita e hão de ver se entre eles só se acham ignorantes, e se o número imenso de homens de mérito e respeito que a abraçaram lhes permite relegá-la ao rol das crendices de gente à-tôa. [...]" (PLE, 1957, p. 15)

-- "Alors on ajoute que s'il n'y a pas supercherie, des deux côtés on peut être dupe d'une illusion. En bonne logique, la qualité des témoins est d'un certain poids; or c'est ici le cas de demander si la doctrine spirite, qui compte aujourd'hui ses adhérents par millions, ne les recrute que parmi les ignorants? [...]" (LE, 1857, p. 17; LE, 1860, item IX, p. XXV)

"Ainda os antagonistas aduzem : 'Se não há embuste dos dois lados, podeis ser vítima duma ilusão.' Em boa lógica a qualidade das testemunhas possui certo valor. Ora, aqui é o caso de perguntar se a Crença nos Espíritos, que conta hoje seus adeptos por milhões, só os tem recrutado na grande massa d'os ignorantes. [...]" (PLE, 1957, p. 17)

-- "Un fait démontré par l'observation, et confirmé par les esprits [5] eux-mêmes, c'est que les esprits inférieurs empruntent souvent des noms connus et révérés. Qui donc peut nous assurer que ceux qui disent avoir été, par exemple, Socrate, Jules César, Charlemagne, Fénelon, Napoléon, Washington, etc., aient réellement animé ces personnages? Ce doute existe parmi certains adeptes très fervents de la doctrine spirite; ils admettent l'intervention et la manifestation des esprits, mais ils se demandent quel contrôle on peut avoir de leur identité. [...]" (LE, 1857, p. 20; LE, 1860, item XII, p. XXVIII)

"Um fato, demonstrado pela observação e confirmado pelos Espíritos, eles próprios, é que os Espíritos inferiores abusam às vezes de nomes conhecidos e reverenciados. Portanto, quem pode garantir-nos que, dizendo haver sido, por exemplo, SÓCRATES, Júlio CÉSAR, CARLOS Magno, FÉNELON, BONAPARTE, WASHINGTON, etc., hajam de fato animado tais personagens? Existe dúvida até no meio de certos adeptos muito fervorosos da Crença Espírita, que admitem a intervenção e manifestação dos Espíritos, mas perguntam-se que espécie de controle se pode ter da identidade deles." (PLE, 1957, p. 20)

Pronto. Aí está mais um texto para reflexão dos espíritas kardecistas, estes curiosos seres que adoram brigar por palavras e que, por pura ignorância ou incapacidade reflexiva mesmo, não admitem o fato de que, mesmo dentro de uma mesma obra kardequiana, quando fora de restrito contexto, os seus "termos prediletos" são ambíguos.

______________________
1- Foi muito provavelmente por esta razão que Guillon Ribeiro (FEB) -- e, em sua esteira, Herculano Pires (LAKE), que também se aproveitou em outros momentos da tradução febiana (vide, por exemplo, aqui) -- resolveu, ali, traduzir principes por "princípio", o que, além de ser uma adulteração (ainda que pequena) do que realmente consta na obra original, não me parece recobrar o sentido que Kardec intentou dar à frase. [voltar]
2- O Primeiro Livro dos Espíritos (São Paulo: Companhia Editôra Ismael, 1957), edição comemorativa da versão primeira de Le Livre des Esprits (1857) em texto bilíngue, francês-português, sendo a tradução e as notas devidas a Canuto Abreu. [voltar]
3- Apesar de parecer inconsistente historicamente tal afirmação (e de fato o é, como o item 222 da edição definitiva de O Livro dos Espíritos trata de corrigir), foi exatamente isso o que Kardec disse. [voltar]
4- Nesta edição o trecho encontra-se dentro de um parágrafo, e sem "d'ailleurs". [voltar]
5- Na edição de 1860, esprits passou a constar como Esprits (com a inicial maiúscula) em todo lugar onde aparecia neste trecho. [voltar]

domingo, dezembro 09, 2012

De "espiritismo" e "kardecismo"

Há muita discussão estéril no meio espírita. Uns bradam daqui, outros convulsionam-se dali, e assim a coisa vai "caminhando"... Pitacos linguísticos, por exemplo, não faltam. Mas raramente vê-se algo que preste neste sentido. É sempre a mesma ladainha insólita: "Só existe um espiritismo", "O termo kardecismo é impróprio para designar o sistema filosófico-religioso que emerge dos livros de Kardec", ou então -- caso mais patológico -- "Kardecismo não existe!"... Bem, fato é que tais afirmações não se sustentam. Seja historicamente e lexicograficamente (a primeira e a terceira), seja etimologicamente e lexicograficamente (a segunda). Um dia, quando estiver de bom humor, escreverei sobre isso.

sábado, dezembro 17, 2011

Você conhece o Dr. Sérgio Felipe?

Conhecendo ou não, talvez seja aconselhável clicar no link abaixo para saber mais sobre este grande "pesquisador" de assuntos na fronteira entre Ciência e Espiritualidade...

Dossiê "Sérgio Felipe de Oliveira"