segunda-feira, outubro 30, 2023

Uma curiosa concorrência

Nas décadas de 1970 e 1980, as editoras Espiritualista e Eco (vide aqui) disputavam acirrada e quase que exclusivamente o mercado de livros de umbanda, quimbanda, feitiçaria e cultura popular. Elencarei abaixo alguns títulos que mostram como isso era feito de forma bastante explícita:

- Pomba-Gira (as duas faces da umbanda), Antonio Alves Teixeira, Ed. Eco, 1966
- Pomba Gira (mirongueira), José Ribeiro, Ed. Espiritualista, 1970

- Catecismo de umbanda, Ab'D 'Ruanda, Ed. Espiritualista
- Catecismo do umbandista, Pompílio Possera Eufrásio, Ed. Eco

- Oxalá (o médium supremo), José Ribeiro, Ed. Espiritualista
- Oxalá, Lucius (Antonio Alves Teixeira), Ed. Eco

- Dicionário africano de umbanda, José Ribeiro, Ed. Espiritualista
- Dicionário da umbanda, Altair Pinto, Ed. Eco

- Guia e ritual para organização de terreiros de umbanda, Tôrres de Freitas e Silva Pinto, Ed. Eco
- Formação e cruzamento de terreiros de umbanda, N. A. Molina, Ed. Espiritualista

- O poder das ervas na umbanda, José Ribeiro, Ed. Eco
- Ervas sagradas na umbanda, João Sebastião das Chagas Varella, Ed. Espiritualista

- Cerimônias da umbanda e do candomblé, José Ribeiro, Ed. Eco
- O ritual na umbanda e no candomblé, José Paiva de Oliveira, Ed. Espiritualista

- Despachos e oferendas na umbanda, Antonio Alves Teixeira Neto, Ed. Eco
- Manual de oferendas e despachos na umbanda e na quimbanda, N. A. Molina, Ed. Espiritualista

- Como desmanchar trabalhos de quimbanda (2 vols.), Antonio Alves Teixeira, Ed. Eco
- Como fazer e desmanchar trabalhos de quimbanda, N. A. Molina, Ed. Espiritualista

- Preto velho e seus feitiços, Antonio Alves Teixeira Neto, Ed. Eco
- Feitiços de preto velho, N. A. Molina

- Livro de São Cipriano, Possidônio Tavares | Perdigão Vizeu | Botelho Sabugosa, Ed. Eco
- Idem, N. A. Molina, Ed. Espiritualista

- Livro da Cruz de Caravaca, Ed. Eco
- Idem, Ed. Espiritualista

- Como cortar olho grande, N. A. Molina, Ed. Espiritualista
- Como evitar o olho grande, Carlos Francisco Xavier, Ed. Eco

- A cura pela simpatia, N. A. Molina, Ed. Espiritualista
- Como fazer simpatias, Maria Bebiana Ferreira dos Santos, Ed. Eco

- Manual da cartomante, Yllema Hormazabal, Ed. Eco
- Antigo manual da cartomante, N. A. Molina, Ed. Espiritualista

- Manual de rezas e mandingas, Cândido Emanuel Félix, Ed. Eco
- Antigo breviário de rezas e mandingas, N. A. Molina, Ed. Espiritualista

-- Levantamento realizado em jun/2021 e atualizado em out/2023.

N. A. Molina, um prolixo autor

Pouco sei do autor N. A. Molina, que escreveu sobre feitiçaria, umbanda, quimbanda e cultura popular, além de que nascera em 1931, dado obtido de pesquisas realizadas no Catálogo de Livros da Biblioteca Nacional em 28/01/2013. Suas obras começaram a ser publicadas na década de 1970, pela Editora Espiritualista Ltda., que lançou todas elas. Iniciei ainda em 2013 um levantamento dos livros dele, atualizado de tempos em tempos. Até o momento (data-base: 30/10/2023), foram encontradas 53 obras, algumas delas integrantes de coleções, como a Coleção 7 e a Coleção Saravá. Abaixo, a relação dos livros desta última coleção que encontrei até então, não necessariamente em ordem de publicação:
1- Exu
2- Ogum
3- Oxum
4- Oxóce
5- Xangô
6- Inhasã
7- Ibeijada
8- Iemanjá
9- Obaluaiê
10- Seu Tiriri
11- Pomba Gira
12- Seu Marabô
13- Seu Caveira
14- Maria Padilha
15- O Povo d'Água
16- Seu Zé Pelintra
17- Seu Tranca Ruas
18- A Linha das Almas
19- O Rei das Sete Encruzilhadas

Outros livros que Molina escreveu sobre umbanda/quimbanda:
-- "Formação e cruzamento de terreiros de umbanda"
-- "Feitiços de preto velho"
-- "Feitiços de um preto velho quimbandeiro"
-- "Trabalhos de um preto velho feiticeiro"
-- "Como fazer e desmanchar trabalhos de quimbanda"
-- "Trabalhos de quimbanda na força de um preto velho"
-- "Despachos e trabalhos de quimbanda"

sexta-feira, junho 04, 2021

Autores umbandistas e suas autocontradições

É pena que com o ingresso de letrados metidos a escritores no universo umbandista a coisa tenha perdido sua simplicidade original e se transformado numa confusão só. Já os primeiros autores que escreveram sobre o assunto não se entendiam (vide aqui). Aliás, eram até autocontraditórios! Além de Lourenço Braga, autor cuja obra principal tivemos oportunidade de analisar em outra ocasião (vide link fornecido), há outros. Vejamos.

Emanuel Zespo, em "O que é a umbanda?" (2a. ed., 1949), à pág. 47 diz: (...) convidamos os kardecistas a visitar sessões e terreiros de Umbanda onde "baixam" os Grandes Orixás. Mas na nota 8 do cap. II (pág. 36) havia dito: O supremo Xangô, como sucede com os demais Grandes Orixás africanos, "não baixa" à terra... Ora, os ditos "Grandes Orixás" baixam ou não?

Oliveira Magno, à pág. 18 de "A umbanda esotérica e iniciática" (1950), diz: (...) Mìsticamente, os Orixás representam legiões de espíritos sob a regência ou o comando de um espírito chefe (...) ou seja, as sete linhas, ou melhor, o Setenário nagô com a sua correspondência.

Adiante, porém, na pág. 41:
(...) Oxalá, Iêmanja, Ogun, Oxosse, Xangô, Oxun, Omulu, nomes êsses dados às sete legiões de espíritos governantes dos sete dias da semana. Chamamos a atenção que esta denominação não significa ôrixás mas, sim, nomes êsses dados a cada uma das legiões (ou linhas) que constituem o Setenário nagô.
Vai entender...

Em 1953 veio a lume a obra de Aluizio Fontenelle "A umbanda através dos séculos". À pág. 159 da 5a. edição, consta a seguinte polêmica afirmação do autor:
Sobre essa Umbanda comum que se pratica nos inúmeros terreiros do Brasil, essa Umbanda mistificada e misturada aos credos fetichistas conhecidos com os nomes de Candoblé, Cangerês, Quimbanda etc., estou de pleno acordo com a divisão da mesma em sete (7) linhas; entretanto, segundo as comunicações que me foram dadas por entidades do Astral, trabalhadores das falanges de pretos velhos, caboclos, hindus, e até mesmo pelos próprios EXUS, já essa divisão sofre uma severa modificação (grifei).
À pág. 161, porém, ao comentar sobre sua divisão, diz: Pelo exposto, o REINO DE OBATALÁ comanda sete cortes, as quais, por sua vez, comandam as 7 linhas de Umbanda (...).

Ou seja, a divisão da umbanda em sete linhas "sofre uma severa modificação" e continua em sete linhas (?!).

Da pág. 10 de "As impressionantes cerimônias da umbanda" (1955), obra de Byron Torres de Freitas e Tancredo da Silva Pinto, depreende-se que "Oxalá" seria apenas o nome de uma linha de umbanda, contradizendo o que consta na pág. 7: Oxalá, filho de Deus. Na mesma pág. 10, é dito que o chefe da falange de Oxalá, ou seja, o orixá maior desta falange, de nome Oxalá Alufân, "baixaria" nos terreiros de 21 em 21 anos, mas foi dito na pág. 9 que os grandes orixás não baixam à terra...

O já citado Emanuel Zespo, à pág. 63 de "Codificação da Lei de Umbanda - parte científica e parte prática" (1960), diz que orixá "é uma entidade do plano invisível que jamais encarnou entre humanos" (grifei). À pág. 140, porém, ele zomba dessa ideia! Vejam: "orixás são, antes e acima de tudo, fôrças da natureza, princípios criadores ou destruidores, sòmente personalizáveis na imaginação do homem sempre pronto a pensar num Deus barbudo e velho, qual o Padre Eterno dos católicos" (grifei). Pode isso, Adirso?!

José Paiva de Oliveira, apesar de afirmar, às págs. 54 e 56 de "Os orixás africanos na umbanda", que a correlação de tais divindades com santos católicos apenas se deu como forma dos sacerdotes africanos vindos ao Brasil como escravos fugirem à perseguição religiosa de seus senhores, católicos, ou seja, como forma de disfarce, às págs. 103 e 105 do mesmo livro "escorrega", considerando Jesus Cristo e São Cosme e São Damião como orixás propriamente ditos, o primeiro identificado com Oxalá, e os outros dois com Ibeji.

Nota: A abertura deste post foi alterada em 04/10/2023 e um outro autor contraditório foi acrescentado em 08/11/2023

quinta-feira, maio 27, 2021

Não atualização em números de edição

Em 1951 foi publicada, pela Gráf. Ed. Aurora, a 2ª. edição de “Alquimia de Umbanda”:
Por volta de 1955, relançada na “Coleção Espiritualista” da mesma editora, esqueceram de atualizar o número da edição:
Em 1959, pela Editora Espiritualista, foi lançada a 3ª. edição de "O Espiritismo no Conceito das Religiões e a Lei de Umbanda":
Em 1983 foi lançada uma nova edição, com capa ilustrada e várias cores:
A folha de rosto do livro, entretanto, registrou igualmente "3ª. edição":
Em 1960, pela Editora Espiritualista, foi lançada a 2ª. edição de “Codificação da Lei de Umbanda”:
Mais tarde, na década de 1970 ou início da de 1980, já com capa ilustrada e várias cores, saiu uma nova edição:
Curiosamente, porém, foi mantida a mesma folha de rosto da 2ª. edição:

sábado, janeiro 30, 2021

"A construção histórica da literatura umbandista": inexatidões, erros e informações falsificadas

(Edmar Arantes)

Há dez anos atrás adquiríamos o livro mencionado no título desta postagem, conforme informamos em outro post deste mesmo blog (aqui). Escrito por Diamantino Trindade, prefaciado por Alexandre Cumino e publicado em 2010 pela Editora do Conhecimento, que afirma na orelha da obra ser o autor "considerado o maior historiador da umbanda", o livro, que contém 288 páginas, é dividido em 6 (seis) partes, a saber: "Antônio Eliezer Leal de Souza: o primeiro escritor de umbanda", "A umbanda na ótica dos umbandistas", "A umbanda na ótica da sociologia e da antropologia", "A umbanda na ótica da Igreja Católica", "A umbanda na ótica do kardecismo" e "A umbanda na ótica das revistas". Aqui, neste texto, restringir-nos-emos à exposição dos problemas encontrados nas duas primeiras partes, que perpassam 174 páginas, a grande maioria deles notados já há dez anos. O texto será dividido em seções, nomeadas pela espécie de "problema" exemplificado e em ordem crescente de gravidade. Erros menores, como trocas de nomes, não serão expostos.

Inexatidões
O autor exibe as capas da maior parte dos livros citados no texto, mas, com exceção daquelas exibidas nas páginas 30, 31 e 84, não especifica as edições referentes a elas, fazendo com que o leitor tenha a falsa impressão de que as capas apresentadas correspondem às edições originais, o que nem sempre é verdade.

Dois pesos, duas medidas
Referindo-se a Loureço Braga, diz o autor: "Lourenço prestou um desserviço à umbanda quando afirmou que os exus são egoístas, interesseiros e vingativos" (pág. 47). Ora, ora... Leal de Souza, referindo-se a estes seres, disse praticamente o mesmo no cap. XIV (A magia negra) de seu livro O Espiritismo, a Magia e as Sete Linhas de Umbanda: "Tais entidades tem ufania de poder; são com frequência, irritadiças e vingativas"... A respeito de Leal de Souza, porém, Trindade não faz crítica alguma. Muito pelo contrário! Só elogios. Muitos elogios. Elogios por tudo quanto é canto...

Uma omissão capciosa
Num passar de olhos no índice da obra, observamos que o autor simplesmente fez "vistas grossas" ao sacerdote e escritor umbandista F. Rivas Neto, autor de importantes obras, como Umbanda – a Proto-Síntese Cósmica, publicada pela Livraria Freitas Bastos em 1989 e posteriormente reeditada pela Editora Pensamento. Não temos dúvida de que isto ocorreu por questões de ordem pessoal, e é lamentável que um autor que pretenda abordar historicamente determinado assunto simplesmente omita certos nomes por questões de afeição. Curiosidades à parte, Diamantino Trindade fez questão de mencionar a si mesmo dentre os autores da literatura umbandista, ainda que não tenha o mesmo alcance de Rivas Neto neste campo.

Informações erradas
1- À pág. 42 consta que o livro Umbanda, de João de Freitas, teria sido publicado em 1941 pela Editora Espiritualista. Grande erro. Tal livro foi publicado inicialmente sem editora e, até onde sei, nunca chegou a ser editado pela Espiritualista. E mais: esta editora nem mesmo existia em 1941! Só foi criada em meados de 1957 (vide aqui).
2- À pág. 43 consta que o referido livro foi publicado após o Primeiro Congresso Brasileiro de Espiritismo de Umbanda. Está errado. O livro de João de Freitas foi publicado antes, em 1941 (o livro do congresso saiu em 1942).
3- À pág. 47 consta que Umbanda (Magia Branca) e Quimbanda (Magia Negra), livro de Lourenço braga, teria sido publicado por uma tal Editora São José. Está errado. O livro foi publicado pela Livraria Jacintho.
4- Na mesma página Trindade diz que Braga "não havia compreendido que a umbanda era uma religião autônoma e não fazia parte do espiritismo". Errado. Braga nem mesmo associa o conceito de religião a "umbanda", ora utilizando a palavra para designar "magia branca", ora para nominar uma "organização espiritual".
5- E o autor continua... Afirma que Braga teria dito que a "umbanda tornou-se conhecida no Brasil através da colonização africana", ignorando, portanto, seu caráter de religião brasileira. A transcrição não fora feita corretamente. O que Lourenço Braga disse foi o seguinte: "'Umbanda' tornou-se conhecida no Brasil através da colonização africana. Sua significação era a seguinte: -- fazer magia, por intermedio das forças invisiveis [...]" (Umbanda e Quimbanda, 1942, p. 21). Ou seja, claro está que Braga referia-se à palavra "umbanda", não à religião umbanda, mesmo porque, conforme já dissemos, no livro o autor não utiliza a palavra "umbanda" para designar uma religião.
6- À pág. 48 Trindade afirma que a obra Trabalho de Umbanda ou Magia Prática, de Lourenço Braga, teria sido publicada em 1950 por Edições Fontoura, quando na realidade foi publicada em 1946 pela Editora Moderna...
7- Na pág. 49, referindo-se às descrições que Lourenço Braga (Trindade tem verdadeira fixação em tentar diminuir o trabalho deste!) fizera sobre os exus, diz: "Estas descrições foram suficientes para que os 'santeiros' criassem as imagens aberrantes que ainda hoje são comercializadas nas casas de artigos religiosos de umbanda". Erro. Antes da publicação do trabalho de Braga já era comum serem associadas aos exus figuras estranhas. Por exemplo, na obra Umbanda (1941), de João de Freitas, capítulo No Leblon, o autor foi apresentado à imagem de Exu Tiriri: "uma cabeça com dois chifres e orelhas pontiagudas à semelhança de Fauno, o deus campestre, segundo a mitologia romana".
8- À pág. 51 consta que a obra Umbanda Esotérica e Iniciática (1950) teria sido publicada pela Editora Espiritualista. Errado. Ela foi lançada pela Editora Aurora, só posteriormente tendo sido editada pela Espiritualista.
9- À pág. 52 consta que a obra Umbanda e Ocultismo teria sido publicada pela Editora Espiritualista. Errado. Ela foi lançada pela Editora Aurora em 1953, só posteriormente tendo sido editada pela Espiritualista.
10- À pág. 55 consta que a obra Alquimia de Umbanda teria sido publicada pela Editora Espiritualista em 1950. Errado. Esta obra fora lançada pela Editora Coruja em 1949, só posteriormente sendo editada pela Espiritualista.
11- Na mesma página, consta que a obra Umbanda Mista teria sido publicada pela Editora Espiritualista. Errado. Esta obra fora lançada sem editora em 1951, só posteriormente sendo editada pela Espiritualista.
12- À pág. 58 consta que a obra A Umbanda Através dos Séculos teria sido publicada em 1950 pela Editora Espiritualista. Errado. Em 1950 a Ed. Espiritualista nem mesmo existia!
13- À pág. 60 diz que a obra Exu teria sido publicada em 1951 pela Editora Espiritualista. Errado. Ela foi publicada sem editora em 1952, só posteriormente tendo sido editada pela Espiritualista.
14- À pág. 70 é dito que a obra O que é a Umbanda? teria sido publicada pela Biblioteca Espiritualista Brasileira em 1953. Errado. Ela foi publicada sem editora em 1946, e com o autor (Emanuel Zespo) adotando seu nome verdadeiro, Paulo Menezes. A edição de 1953 é a 3a..
15- Na mesma página é dito que "a obra não traz grandes novidades em relação ao que já havia sido escrito anteriormente", mas ela foi pioneira em expor a umbanda como a Quarta Revelação (o Antigo Testamento seria a primeira, o Novo Testamento a segunda, e a Doutrina Espírita a terceira).
16- À pág. 74 é dito que a obra Lições de Umbanda (1954) teria sido publicada pela Editora Espiritualista. Errado. Ela foi lançada pela Editora Aurora, só posteriormente tendo sido editada pela Espiritualista.
17- À pág. 76 é afirmado que o Jornal de Umbanda teria sido fundado em 1939 por Zélio de Morais. Alexandre Cumino expõe informação diversa em sua obra História da Umbanda (2010). Tal jornal teria sido criado em 1949 pela UEUB (União Espírita de Umbanda do Brasil). Vide págs. 158-159 da obra citada.
18- À pág. 80 afirma que a obra Doutrina Secreta da Umbanda, de W. W. da Matta e Silva, teria sido publicada em seguida a Umbanda - Sua Eterna Doutrina (1957). Errado. Em sequência à obra referida foi publicada Lições de Umbanda e Quimbanda nas Palavras de um Prêto-Velho (1961). Doutrina Secreta da Umbanda só seria publicada em 1967.
19- Na mesma página, afirma que Macumbas e Candomblés na Umbanda teria sido publicada em 1975. Errado. Tal obra foi publicada em 1970.
20- À pág. 86 é dito que o livro Okê Caboclo! teria sido publicado em 1961 pela Editora Eco. Errado. Tal livro foi publicado em 1968. Aliás, em 1961 a Editora Eco nem mesmo existia!
21- À pág. 88, Trindade afirma que Umbanda dos Prêtos Velhos teria sido publicada em 1965 pela Editora Espiritualista e só depois reeditada pela Editora Eco. Não conseguimos verificar esta informação, e acreditamos estar incorreta, pois há uma edição já de 1965 pela Eco.
22- Na mesma página é dito que na obra referida o autor procura desvincular a umbanda do ramo do espiritismo. Não é isso que o autor faz. Ele diferencia umbanda de kardecismo, mas considera ambos como formas de espiritismo.
23- Na pág. 89 Trindade fala da reprodução, por Antônio Alves Teixeira Neto, de trecho do autor Alvarino Selva. Não se trata de um outro autor. Alvarino Selva é apenas um dos pseudônimos que Teixeira Neto utilizava (vide, deste autor, publicado sob o pseudônimo Antônio de Alva, Exu – o gênio do bem e do mal, Ed. Espiritualista, s/d, pág. 10).
24- À pág. 91 é dito que o periódico Jornal de Umbanda teria sido lançado em 1947. Sobre este ponto, vide nota 17, acima.
25- À pág. 103 Trindade diz que no plano físico a umbanda teria sido fundada em 1935 pelo Cap. Pessoa (José Álvares Pessoa). Um disparate, simplesmente.
26- Na pág. 114 é dito que a obra Umbanda de Caboclos teria sido publicada em 1972. Errado. Ela foi publicada em 1967.
27- Na pág. 134 é dito que a obra de Cavalcanti Bandeira O que é a umbanda teria sido publicada em 1973. Errado. Ela foi publicada em 1970.

Falsificações históricas
1- À pág. 22 Trindade afirma, referindo-se a Leal de Souza: "Devido ao seu prestígio e conhecimento, o Primeiro Congresso Brasileiro de Espiritismo de Umbanda, realizado em 1941 no Rio de Janeiro, aprovou essas Sete Linhas". Tremenda MENTIRA! As "linhas" de Leal de Souza não foram sequer apresentadas no congresso referido! Representando as tendas espíritas São Jerônimo e São Jorge, respectivamente, fundadas sob ordem do Caboclo das Sete Encruzilhadas (Leal de Souza, que não participou do congresso, também dirigia uma dessas tendas, a Nossa Senhora da Conceição), os drs. Jayme Madruga e Antonio Barbosa nem tocaram no assunto em suas preleções! (O Primeiro Congresso Brasileiro de Espiritismo de Umbanda teve os trabalhos ali apresentados compilados em livro. Basta consultá-lo. Está disponível na internet.)
2- À pág. 43, mais uma vez tentando insuflar o prestígio de Leal de Souza, afirma: "João de Freitas [em Umbanda, 1941] cita Leal de Souza diversas vezes, mostrando que era uma referência importante para ele" (grifei). Tremendo EXAGERO! Temos a obra de João de Freitas em sua 3a. edição, de 1946. Leal de Souza é citado apenas duas vezes, com trechos transcritos às págs. 43-44 e 121 do referido livro. Aliás, diga-se de passagem, João de Freitas, no Primeiro Congresso de Espiritismo de Umbanda (1941), posicionou-se CONTRA a divisão linhas brancas / linhas negras utilizada por Leal de Souza em sua obra O Espiritismo, a Magia e as Sete Linhas de Umbanda (1933). Vejamos o que ele diz: "Não concebendo, como não podemos conceber a Umbanda sem o seu ritual, porque sem ele, ela deixa de ser Umbanda, proponho o seguinte: 1.°) A Federação Espírita de Umbanda não reconhecerá, por forma alguma, linhas brancas nem linhas pretas; visto que isto significaria o seu desmembramento em detrimento do esforço dispendido [...]".
3- À pág. 103 Trindade diz que a obra Umbanda: religião do Brasil teria sido publicada em 1968. Como ela fora publicada em 1960, pensamos inicialmente que se tratava apenas de mais uma informação errada do autor. Mas não! Foi tudo muito bem urdido. Agiu realmente como um pilanta o Sr. Diamantino. Pois vejam: na pág. 107, para que a fundação da umbanda coincidisse justamente com o 1908 tão aclamado por ele e outros irresponsáveis (essa data não tem fundamento histórico algum), Trindade ADULTEROU trecho de um artigo de José Álvares Pessoa constante do livro citado! O original diz o seguinte: "Há uns quarenta anos mais ou menos, aproveitando a enorme aceitação dos fenômenos espíritas por parte dos brasileiros, entidades que presidem o destino espiritual da raça resolveram levar adiante a árdua tarefa de lhes dar uma religião que fosse genuinamente brasileira" (Umbanda: religião do Brasil, Ed. Obelisco, 1960, pág. 63, grifo meu). Ou seja, tendo a obra sido publicada em 1960, a ação dessas entidades, com vistas à criação de uma religião genuinamente brasileira, teria ocorrido por volta de 1920. Pois bem. E o que Diamantino Trindade fez? Onde constava "quarenta anos", transcreveu "sessenta anos"... Levando em conta que ele já modificara a data de publicação original da obra para 1968, tirando sessenta anos, chegaríamos no aclamado 1908... Realmente inacreditável a desfaçatez do autor!

sexta-feira, janeiro 29, 2021

Uma citação falsificada por um intelectual de umbanda

Diamantino Coelho Fernandes foi uma das figuras-chave no trabalho de validação da umbanda perante a sociedade. Tendo sido um dos organizadores do Primeiro Congresso Brasileiro de Espiritismo de Umbanda, ocorrido no Rio de Janeiro em 1941, suas duas teses ali apresentadas esbanjam erudição. Certo ponto porém de seu trabalho "O espiritismo de umbanda na evolução dos povos" nos chamou a atenção:
Trouxeram a Umbanda, no recôndito de suas almas atribuladas de escravos, vendidos como mercadoria de feira aos grão-senhores do Brasil, os primeiros sudaneses e bantus que aqui chegaram cerca do ano de 1530, procedentes de Angola, da Costa dos Escravos, do Congo, da Costa do Ouro, do Sudão e de Moçambique (Edison Carneiro, Religiões negras, Civilização Brasileira, 1936).
Isto não consta na obra referenciada! O autor simplesmente falsificou a autoria do trecho para tentar dar credibilidade à informação ali contida. (Edison Carneiro foi um respeitado etnólogo brasileiro.)

Nota: Diamantino Coelho Fernandes já havia se desvinculado da umbanda no fim da década de 1940, tornando-se então um dos propagandistas da obra Vida de Jesus ditada por Ele Mesmo e da "corrente vibratória" Círculo Espiritual do Amor de Jesus, acreditando "cumprir instruções recebidas através de luminoso mensageiro de Jesus". Na década de 1960 começou a publicar títulos como suposto médium de espíritos da envergadura de Maria de Nazareth, por exemplo. Acreditava-se a reencarnação do Apóstolo Thiago. Em fevereiro de 1970, "por determinação do Senhor Jesus" mediado pelo espírito do Apóstolo Thomé, trouxe à Terra a Nova Ordem de Jesus, "instituição espiritualista, beneficente e cultural"...

terça-feira, novembro 03, 2020

Proposta para definição de "umbanda"

Conforme dissemos na postagem anterior (aqui), a prática religiosa denominada inicialmente Linha Branca de Umbanda, com o tempo, tornou-se, simplesmente, Umbanda. Propomos abaixo uma definição que acreditamos enfeixar suas características nucleares.

Umbanda — Prática religiosa com o objetivo de libertar obsessões e curar moléstias espirituais, realizada nos chamados terreiros, fundamentada na fé em um deus maior (por vezes denominado Zâmbi), em divindades do panteão iorubano1 e em santos católicos, e caracterizada por ritualística própria (defumações, cantos ritmados, etc.), mediunismo ostensivo e manifestações de espíritos arquetipicamente classificados (caboclos, pretos-velhos, crianças, etc., além de, ocasionalmente, exus2).

1 Já na década de 1910, foi iniciado um movimento de "purificação dos trabalhos de magia nos terreiros", para "expurgar Umbanda do rito essencialmente africanista", conforme pág. 15 do periódico O Semanário de número 91 (2 a 9 de janeiro de 1958). A partir de então, foram abolidos atabaques e outros instrumentos de percussão em alguns terreiros, e desconsiderada a existência das divindades do panteão iorubano. Não bastasse, nomes de algumas das referidas divindades passaram a ser utilizados somente para "apelidar" ícones do catolicismo, conforme se observa dos livros "O Espiritismo, a Magia e as Sete Linhas de Umbanda", Leal de Souza, 1933, e "Umbanda (magia branca) e Quimbanda (magia negra)", Lourenço Braga, 1942, por exemplo. Assim, Jesus Cristo poderia ser também chamado Oxalá; a Virgem Maria, Iemanjá; São Jerônimo, Xangô; e por aí vai. Para piorar, foi criado o artificalismo das ditas "sete linhas de umbanda", algo completamente estranho à religião original. (Por incrível que pareça, essa tendência permanece vigente nos tempos atuais)
2 Enquanto alguns autores umbandistas, como Leal de Souza e Lourenço Braga, consideram os exus entidades com individualidade (vide obras citadas), outros, como João de Freitas, têm opinião bastante diversa, considerando que exus não seriam almas ou espíritos, mas frutos da ação do pensamento do médium sobre certos fluidos sutis (vide livro "Exu na Umbanda", 1971)

— Texto modificado nos dias 27, 30 e 31 de outubro de 2023

quinta-feira, setembro 24, 2020

Linha Branca de Umbanda e Linha Negra de Umbanda

(Edmar Arantes)

Muitos afirmam, como Lourenço Braga em Umbanda (magia branca) e Quimbanda (magia negra), e o próprio título da obra já o diz, que o termo "umbanda" refere-se especificamente a magia branca. Isso não parece ser verdade.

O citado autor diz o seguinte:

"Não devemos dizer 'Linha Branca de Umbanda' e nem 'Linha de Umbanda', no sentido que muita gente emprega quando se refere a Umbanda. Se dissermos 'Linha Branca de Umbanda', compreender-se-á logo que há também 'Linha Negra de Umbanda', isto é, que na Umbanda há magia negra. É um grande erro, tal afirmativa! Umbanda é Magia Branca!" (BRAGA, 1942, p. 24)

Héli Chatelain, notável linguista e estudioso do quimbundo, por outro lado, na nota 180 (p. 268) de sua obra Folk-tales of Angola (1894) diz o seguinte (grifo meu):

"U-mbanda is derived from Ki-mbanda, by prefix u-, as u-ngana is from ngana. Umbanda is: 1) The faculty, science, art, office, business (a) of healing by means of natural medicines (remedies) or supernatural medicines (charms); (b) of divining the unknown by consulting the shades of the deceased or the genii, demons, who are spirits neither humans nor divine; (c) of inducing these human and non-human spirits to influence men and nature for human weal or woe. 2) The forces at work in healing, divining, and the influence of spirits. 3) The objects (charms) which are supposed to establish and determine the connection between the spirits and the physical world." (apud RAMOS, 1934, pp. 88-89, rodapé)

Em uma tradução livre:

"U-mbanda deriva-se de Ki-mbanda pelo prefixo u-, como u-ngana vem de ngana. Umbanda é: 1) a faculdade, ciência, arte, profissão, ofício: a) de curar por meio de medicina natural (remédios) ou de medicina sobrenatural (encantamentos, feitiços); b) de adivinhar o desconhecido pela consulta às almas dos mortos ou aos gênios, demônios, que são espíritos nem humanos nem divinos; c) de induzir estes espíritos, humanos ou não, com vistas a influenciar os homens e a natureza para a cura ou o infortúnio humanos. 2) As forças agindo na cura, adivinhação e influência dos espíritos. 3) Os encantamentos e feitiços que se supõem estabelecer e determinar a ligação entre os espíritos e o mundo físico".

Ou seja, dentro do conjunto de significados de "umbanda" também se encontrava a dita magia negra.

No Brasil, os significados expostos por Héli Chatelain foram de certa forma reunidos. Arthur Ramos afirma que alguns negros e mestiços cariocas utilizavam a expressão Linha de Umbanda para designar certa prática religiosa (RAMOS, 1934, p. 89). Deduzimos, por inferência, que tal prática seria caraterizada pela presença de um "sacerdote" (o pai-de-santo ou chefe de terreiro) que teria o que foi descrito em 1 (o que já inclui a crença em 2 e 3), e numa atitude de devoção e respeito de seus pacientes/consulentes frente aos espíritos, humanos ou não, acessados por ele. Nesta direção, não é de todo desarrazoado falar-se em Linha Branca de Umbanda e em Linha Negra de Umbanda. Aquela seria a Linha de Umbanda em que o pai-de-santo teria 1c restrito para a cura, enquanto esta seria a Linha de Umbanda sem 1a e com 1c restrito para práticas maléficas, causadoras de infortúnio.

No Brasil, a umbanda-magia branca tornou-se característica distintiva de uma prática religiosa denominada Linha Branca de Umbanda, posteriormente chamada apenas Umbanda, em clara restrição indevida do significado original da palavra, de conotações mais amplas. Por outro lado, a umbanda-magia negra tornou-se característica distintiva da Linha Negra de Umbanda, posteriormente denominada Quimbanda.

Nota: Alguns quimbandeiros alegam que na Quimbanda também se praticam curas. Neste caso, a magia branca não seria característica distintiva da Umbanda.

BRAGA, Lourenço. Umbanda (magia branca) e quimbanda (magia negra), Livraria Jacintho, 1942
RAMOS, Arthur. O negro brasileiro, Civilização Brasileira, 1934

segunda-feira, junho 08, 2020

Curiosidade editorial sobre "O Atalho" (Luciano dos Anjos, Publicações Lachâtre, 1995)

Logo que tomei em mãos O Atalho, obra de Luciano dos Anjos impressa em março de 1995, conforme página de dados editoriais, me intriguei com duas informações aparentemente destoantes, também constantes ali: a catalogação-na-fonte registra o ano 1993, mas o copyright é de 1994... O fato da última folha do livro ser colada na terceira capa também me intrigou. Explicação para tudo isso: já com a obra catalogada (ano: 1993, 328 p.), e portanto pronta para ser impressa, Luciano tratou de continuar a modificá-la... Coisa incrível! Ao contrário do que é explicitamente afirmado no Posfácio (datado de março de 1991), a revisão final não terminara naquela data. Basta ver que na Bilbiografia é citada, por exemplo, a referência Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 26.01.1995... Ou seja, é falso que o copyright da obra seja de 1994. Vale ressaltar também que as alterações levadas a cabo por dos Anjos resultaram em uma diminuição do número de páginas (de 328 para 326). Então, para que a obra permanecesse concorde com o registro, a editora, miserável, em lugar de criar uma folha extra para colocar o colofão no verso, tratou de indexar a primeira página do Sumário como p. 9 (na realidade é p. 7), resultando na última página, que apresentou o colofão, numerada como 328 (na realidade é 326)... E, como 326 não é um múltiplo de 4 (condição necessária para a formação dos "cadernos" de um livro), a última folha precisou ser colada na terceira capa!